Opinião: Igualdade racial: caminho para a cidadania

A população negra requer ações afirmativas para retirá-la de sua situação histórica de desfavorecimento
18/11/2013 16:45 | Enio Tatto*

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Em 20 de novembro de 1695 o líder Zumbi dos Palmares, símbolo da luta pela liberdade e valorização do povo afro-brasileiro, foi morto em uma emboscada. A simbologia dessa data foi a razão de sua escolha para a celebração do Dia Nacional da Consciência Negra, que já é comemorado em 1.047 municípios brasileiros.

A data está inserida na Semana Nacional da Consciência Negra, quando inúmeras atividades são desenvolvidas com o objetivo de ampliar as discussões sobre os temas raciais, visando, sobretudo, a expansão dos direitos que vêm sendo conquistados pela comunidade afro-brasileira.

No Brasil, nos últimos anos, muito se avançou sobre esse assunto, especialmente depois de os governos Lula e Dilma o terem tornado uma questão de Estado. É de março de 2003, por exemplo, a criação da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial que tem entre suas finalidades a da "formulação, coordenação e avaliação das políticas públicas afirmativas de promoção da igualdade e da proteção dos direitos de indivíduos e grupos étnicos".

Em 2010, outro importante passo foi dado com a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial. Ao mesmo tempo, a política de cotas raciais se estabeleceu nas universidades e agora se amplia com a apresentação, pela presidenta Dilma, de projeto de lei que prevê a reserva 20% das vagas nos concursos públicos federais para negros.

Apesar dessas expressivas melhoras, muitos desafios ainda se colocam. Um deles foi evidenciado em pesquisa recente, feita pelo Dieese conjuntamente com a Fundação Seade e o Ministério do Trabalho, que aponta a discriminação racial no mundo do trabalho. De acordo com o levantamento, os negros têm média salarial até 36,1% menor do que os não negros, dado este constatado nas regiões metropolitanas.

A pesquisa também aponta desproporção em relação à formação educacional, com reflexos diretos na remuneração. Dos negros trabalhadores, 27,3% não haviam concluído o ensino fundamental e apenas 11,8% obtiveram diploma de ensino superior. Já entre os não negros em atividade, 17,8% não terminaram o ensino fundamental e 23,4% formaram-se em uma faculdade.

Ainda segundo com o Dieese, um trabalhador afro-brasileiro com nível superior completo recebe na indústria da transformação, em média, R$ 17,39 por hora, enquanto os que não são dessa etnia chegam a receber R$ 29,03 por hora. A comparação segue, sempre com a constatação da desvantagem da população não negra com relação à negra, na ocupação de postos de direção e planejamento: na Região Metropolitana de São Paulo a diferença é de 5,7% para 18,1%, na de Recife, de 8,3% para 18,6%, e na de Salvador, de 6,9% para 21,3%.

Esses números nos fazem concluir que, a despeito da melhoria, na última década, da qualidade de vida da população brasileira, acompanhada por indicadores favoráveis de redução das desigualdades sociais e regionais, a população negra requer a continuidade de uma política de Estado com ações afirmativas para retirá-la de sua situação histórica de desfavorecimento. E essa consciência a presidenta Dilma tem quando prossegue anunciando medidas como as da criação de uma estância exclusiva para a promoção da saúde dos afrodescendentes no programa Mais Médicos e da ampliação do investimento no programa Juventude Viva, que desenvolve várias ações para a inclusão de jovens negros de territórios vulneráveis à violência.

Neste mês de novembro, a presidenta, após assinar Decreto de criação do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial, afirmou que "a sociedade brasileira tem que superar as consequências do nosso longo período escravocrata, que não acabou com a abolição, porque ressuscitou o racismo como forma de hierarquização social".

* Enio Tatto é deputado estadual (PT) e 1º Secretário da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp).

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