Opinião - O abraço pela água


26/05/2014 10:27 | Enio Tatto*

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No próximo dia 1º de junho a rede "De Olho nos Mananciais", com mais de 40 organizadores, promoverá, no Solo Sagrado em Parelheiros, Parque Ecológico do Guarapiranga no M'Boi Mirim e Parque da Barragem na avenida Atlântica, Capela do Socorro, a 9ª edição do "Abraço à Guarapiranga". A atividade inclui passeios ciclísticos, caminhadas, plantio de mudas, oficinas ambientais, exibição de filmes, cultos religiosos, e se encerra com um abraço simbólico à represa. Seu principal objetivo é o de sensibilizar autoridades e a população sobre a importância da preservação dos mananciais de São Paulo, em particular da Guarapiranga.

Essa iniciativa ganha especial importância neste momento em que São Paulo passa por uma séria crise de abastecimento de água, que tornou evidente o descaso administrativo dos sucessivos governos do PSDB paulista. Não é de hoje que setores da sociedade apontam para o risco de escassez de água em São Paulo, mas a má gestão dos últimos anos conseguiu agravar ainda mais essa situação.

O Sistema Cantareira tem sido alvo das principais manchetes diárias que indicam seu progressivo esvaziamento, registrado em impressionantes fotos de seu solo trincado e de suas paisagens áridas, mas não é só ele que é vítima do descaso tucano. Outros mananciais também estão sob risco, como a represa de Guarapiranga, considerada a mais ameaçada entre as existentes na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). A represa é a segunda maior fonte de água da RMSP. Localizada nas proximidades da Serra do Mar, produz 14 mil litros de água por segundo e é responsável pelo abastecimento de quase quatro milhões de habitantes das regiões Sul e Sudoeste da Capital.

A construção da Guarapiranga foi iniciada em 1906 e durou três anos. Na década de 1920, a represa, ao mesmo tempo em que passou a ser a mais importante de São Paulo, começou a assistir à ocupação de seu entorno, com a edificação de residências e de clubes. Os loteamentos avançaram com a oferta de chácaras e marinas. Com esse histórico, que é acrescido, a partir dos anos 1970, pelo crescimento de núcleos urbanos às suas margens, a Guarapiranga passou a apresentar sinais de degradação, causada, principalmente, pela grande quantidade de despejo de esgotos e de lixo.

Em 1975, diante desse cenário, foi aprovada a Lei de Proteção dos Mananciais, que, entretanto, não foi capaz de superar os desafios existentes. Por essa razão, foram promulgadas as chamadas leis específicas da Guarapiranga e da Billings, respectivamente em 2006 e 2009, as quais me empenhei e contribui para aprovação de ambas. A nova legislação tratou não só da recuperação e preservação das represas, mas também da realização de obras urbanísticas e de regularização fundiária.

Os problemas, porém, continuaram, pois as leis não foram adequadamente implementadas, sobretudo pela falta de investimentos, com consequências na quantidade e na qualidade da água ofertada. E não tem sido apenas a carência de recursos que vem prejudicando o abastecimento hídrico de São Paulo. O modelo de gestão imprimido pelo governo do PSDB à Companhia de Saneamento Básico de São Paulo " Sabesp, por exemplo, esvaziou seu caráter público, principalmente a partir da abertura do capital acionário da empresa na Bolsa de Nova York, em 2000. Essa observação é feita pelo professor aposentado da Escola Politécnica da USP e engenheiro de hidráulica e saneamento, Júlio Cerqueira Cesar, um dos maiores especialistas na área. O professor acrescenta: "com a abertura do capital, a companhia deixou de ser uma empresa de saúde pública e virou um balcão de negócios. Só se preocupa com o lucro dos acionistas, que estão muito satisfeitos. Sucesso financeiro e fracasso completo em saúde pública"".

A esse quadro temos nos oposto firmemente. Na Assembleia Legislativa apresentamos regularmente emendas aos projetos de lei de diretrizes orçamentárias e de orçamento propondo a ampliação de recursos destinados ao tema, a promoção de programa de construção de moradias populares para o reassentamento das famílias em áreas de risco ou de preservação, além da definição de meta de qualidade da água e implantação de ações de educação ambiental na região da Guarapiranga. Temos, ainda, estimulado e participado de audiências públicas para a aplicação das leis específicas da Guarapiranga e da Billings e apresentado requerimentos que pedem esclarecimentos ao Executivo.

Iniciativas como o "Abraço à Guarapiranga", que tem sido realizada pela rede "De Olho nos Mananciais", também contam com o nosso apoio e participação, pois temos a certeza que um mandato popular tem de atuar em conjunto com os movimentos organizados para que as transformações sociais se tornem realidade.

*Ênio Tatto é deputado estadual e 1º secretário da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa (Alesp)

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