Ex-presidente da Petrobras reforça versão de 93 mortos no incêndio de Vila Socó

Investigações apontam 508 mortes, incluindo 240 crianças cujos corpos foram reduzidos a cinzas
01/08/2014 15:50 | Da Redação: Keiko Bailone Fotos: José Teixeira

Compartilhar:

Reunião da Comissão da Verdade sobre o incêndio da Vila Socó<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2014/fg164447.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> André Louro Simões, ex-presidente da subseção da OAB de Cubatão<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2014/fg164448.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Público presente na reunião <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2014/fg164449.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Luiz Marcelo Moreira, presidente da subseção da OAB de Cubatão<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2014/fg164450.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Shigeaki Ueki, ex-presidente da Petrobras<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2014/fg164451.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

"São estimativas", respondeu o ex-presidente da Petrobras Shigeaki Ueki, ao ser confrontado com dados apresentados por Dojival Vieira, membro da Comissão da Verdade da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Cubatão, quanto àquele que teria sido o maior incêndio já ocorrido no país, com 508 mortos - o número oficial é de 93. Ueki, que ocupou também o cargo de ministro de Minas e Energia no governo Geisel (1974 a 1979), disse desconhecer se a Petrobras teria dado apoio logístico-financeiro aos militares em enfrentamentos com militantes de grupos contrários àquele governo, durante os cercos a Brotas de Macaúbas e à região do Araguaia. Somente ao final da oitiva, concordou que o volume total do vazamento de gasolina que provocou o incêndio poderia ter sido maior do que 700 mil litros anunciados na ocasião, e chegado a 2,5 milhões, conforme jornais divulgaram na época.

Em seu depoimento na 132ª reunião da Comissão estadual da Verdade Rubens Paiva, ocorrida nesta quarta-feira, 30/7, sob a presidência do deputado Adriano Diogo (PT), Ueki defendeu o regime a que serviu durante 18 anos e a empresa que presidiu por cinco anos e meio. "Fui o primeiro presidente civil da empresa", justificou-se, ao discorrer sobre sua trajetória profissional, antes da oitiva, aos demais convidados, os advogados Luiz Marcelo Moreira e André Louro Simões, respectivamente presidente e ex-presidente da subseção da OAB de Cubatão.

Sobre a tragédia de Vila Socó, lembrou que durante visita que fizera àquela unidade operacional ficara "escandalizado" com cena semelhante à que havia presenciado também na refinaria de Salvador: pessoas transitando ou construindo moradias em cima de dutos. Disse que procurou atenuar o problema, através de sugestões às autoridades, pedindo o deslocamento dessas famílias, mas nunca foi atendido pelos governos locais.

Ueki referiu-se à tragédia de Vila Socó como "dantesca, chocante" e contou que solicitou abertura de inquérito administrativo para ouvir todas as pessoas que podiam fornecer informações, para apurar responsabilidades. Disse que houve "sensacionalismo" por parte da mídia, ao comentar o destaque dado pela imprensa à multa imposta pela Cetesb à Petrobras, por suposta negligência.

Manipulação de provas

O advogado Luiz Marcelo Moreira lembrou que a reabertura do caso de Vila Socó, após 30 anos da tragédia, servia para apurar a verdade, responsabilizar os culpados, esclarecer sobre a manipulação de provas que constam nos autos e traçar a real dimensão da tragédia com número completo de mortos e desaparecidos. Após lembrar que até hoje nenhum dos culpados foi condenado, afirmou que a impunidade poderá ser enfim revista, já que a OAB de Cubatão entregou o caso à investigação da Corte Internacional dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos.

Questionado sobre a culpa da Petrobras no caso, por falha humana, Ueki declarou que "nunca negamos a culpa; nós a assumimos". Mas, referindo-se ao número de 508 mortos, Ueki negou esse dado, baseando-se em relatórios do Instituto Médico Legal de Santos e São Paulo. Sobre as "240 crianças matriculadas em escolas e que teriam sido reduzidas a cinzas pelo incêndio", alegação feita pelos advogados presentes, Ueki reagiu indagando: "Por que as famílias dessas crianças ou os parentes dos mais de 500 mortos não procuraram a comissão de indenização? Essa indenização, na época, fez com que as famílias ficassem satisfeitas".

Ex-vereador de Cubatão, Dojival Vieira rebateu essa "pergunta-resposta" de Ueki, lembrando que viviam em Vila Socó, à época, principalmente famílias de negros e pobres oriundos do Nordeste. "Morreram famílias inteiras vindas de lá; não havia a quem se reportar porque todos tinham vindo para cá. As crianças que viraram cinzas tiveram anotadas em seu prontuário a palavra excluídas, contou.

Sobre a indenização paga às famílias, Dojival Vieira acrescentou que, por determinação superior, crianças até 12 anos não tiveram direito ao benefício, "pela singela razão de que não eram reconhecidos como força produtiva". E informou que a OAB espera tanto a indenização para os 508 mortos quanto a atualização dos valores pagos à época.

"Operação abafa"

Vieira, jovem vereador de 22 anos à época, observou que não há dúvidas de que houve uma verdadeira "operação abafa" para acobertar o número real de mortos. Leu dados do relatório apresentado pelos promotores Marcos Ribeiro de Freitas e José Carlos Passos (este último já falecido) sobre três estimativas que levaram à conclusão de que o total de mortos chegou a 508, a maioria crianças.

"Esses dados foram divulgados pelo jornal Folha de S. Paulo em sua edição de 25/3/1984", citou. Sobre a multa da Cetesb aplicada à Petrobras, esclareceu que chegava a 13 milhões de cruzeiros (moeda da época), mas a estatal havia recorrido e não constava que houvesse pago.

alesp