Especial Getúlio Vargas - Agosto de 1954: 60 anos de uma tragédia brasileira

Agonia e morte do presidente Getúlio Vargas
13/08/2014 18:28 | Antônio Sérgio Ribeiro*

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Getúlio Vargas discursa na inauguração da Mannesmann  <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-08-2014/fg164605.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Governador Juscelino Kubitschek recebe presidente. Getúlio Vargas em Minas Gerais<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-08-2014/fg164606.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Reunião de generais<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-08-2014/fg164607.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Quinta feira - 12 de agosto de 1954

No Palácio do Catete, estiveram logo cedo o ministro da Justiça, Tancredo Neves, o ex-chefe de polícia, general Armado de Morais Âncora, e o senador Georgino Avelino (PSD-RN), que foi levar sua solidariedade ao presidente da República.

A convite do governador Juscelino Kubitschek, o presidente Getúlio Vargas embarcou em um avião C-47 da FAB para Belo Horizonte, para a inauguração da Usina Siderúrgica Mannesmann. No aeroporto da Pampulha, ao desembarcar, Vargas foi saudado com todas as honras e recebido pelas autoridades civis e militares. Seguiu diretamente para a cidade industrial, onde se localizavam as instalações da Mannesmann, tendo sido entusiasticamente recebido pelo povo mineiro. Durante as festividades o presidente Vargas fez um duro e inesperado discurso, acusando e desafiando os adversários, afirmando:

"Povo de Minas Gerais!

As minhas preocupações com o bem público não me deixam fugir ao dever, onde quer que tenha de ser cumprido. E eu o cumprirei até o fim.

Espalhando o gérmen da discórdia, procurando subverter a força e o prestígio da autoridade, falseando os fatos e fantasiando as intenções, há um propósito de gerar a confusão pela mentira, para levar o país à desordem, ao caos e à anarquia. Para o bem da nossa pátria, podemos confiar nas reações saudáveis da opinião publica e no sentimento de patriotismo e disciplina das Forças Armadas. As classes armadas, sobre as quais repousa o sossego e a tranquilidade da nação, manterão a ordem e asseguração o pleno exercício das instituições democráticas, a justiça cumprirá o seu dever com independência e o povo, nas próximas eleições, manifestará livremente a sua vontade.

Empenharei a autoridade e a honra do governo para que a ordem seja mantida, as garantias constitucionais asseguradas e as próximas eleições realizadas num clima de ordem e tranquilidade. As injúrias que me lançam, as pedras que me atiram, a objurgatória, a mentira e a calúnia não conseguirão abater o meu ânimo, perturbar a minha serenidade, nem me afastar dos princípios de amor e humildade cristã por que norteio a minha vida e que fazem esquecer os agravos e perdoar as injustiças. Por outro lado, não terei condescendência para aqueles que se fazem agentes do crime ou instrumentos da corrupção.

No governo represento o princípio da legalidade constitucional, que me cabe preservar e defender. Dela não me separarei e advirto aos eternos fomentadores da provocação e da desordem que saberei resistir a todas e quaisquer tentativas de perturbação da paz e da tranquilidade pública."

Descanso em Minas

Vivamente aplaudido e por diversas vezes interrompido por gritos de apoio, o presidente Getúlio Vargas, após a cerimônia, participou de almoço oferecido no Palácio da Liberdade e, por sugestão de Juscelino, acabou pernoitando em Minas Gerais, onde pôde descansar e se afastar momentaneamente do torvelinho da capital do país.

Estudantes mineiros fizeram o enterro simbólico do presidente, mas nada que empanasse o brilho da visita de Getúlio Vargas às Alterosas.

No Rio de Janeiro, ainda pela manhã, Carlos Lacerda foi novamente ao quartel da Polícia Militar para fazer mais um reconhecimento dos demais membros da ex-guarda pessoal do presidente que pudessem estar envolvidos no atentado do dia 5 de agosto e que não haviam comparecido à prova realizada anteriormente, não logrando nenhum resultado prático.

No início da noite, também no Rio, houve agitação na avenida Rio Branco com tentativa de depredação da sede do PTB. A polícia tentou, por meios brandos, afastar os manifestantes, mas, sem êxito, teve que serenar os ânimos com jato d"água. A reação deveu-se à fuga dos envolvidos, causando tumulto no centro da cidade. Foram disparados tiros para o ar, o que acabou provocando mais confusão, correrias, feridos e a interrupção do trânsito por horas. A radiopatrulha que fazia a vigilância no centro da cidade foi substituída pela Polícia Militar.

Em comício, com a participação de milhares de pessoas, em praça pública, na cidade de Salvador, que contou com a presença do ex-governador baiano Otavio Mangabeira, dos deputados federais Nelson Carneiro e Nestor Duarte, foi pedida mais uma vez a renúncia de Vargas.

O jornal de Lacerda, Tribuna da Imprensa, como fez durante o episódio da Tonelero, divulgou que dois depoimentos haviam sido prestados na polícia, revelando pela primeira vez o nome de outro membro da guarda pessoal, José Antônio Soares, que deu fuga, por ordem do Palácio do Catete, a Climério. Esta revelação foi feita pelo jornalista Pompeu de Souza, após depoimento de um casal que residia ao lado de Soares, na rua Padre Nóbrega, em Cascadura, no Rio. Como não poderia deixar de ser, o grande culpado era Getúlio Vargas.

O ex-presidente marechal Dutra falou que "a renúncia do presidente da República viria tranquilizar o país". Na Câmara Federal, o deputado udenista Aliomar Baleeiro afirmou que "Getúlio é um espectro que não mais governa". Reagiram os dirigentes sindicais (de oposição) contra as manobras "queremistas" de alguns pelegos.

Completaram-se sete dias do atentado sem que fossem capturados os criminosos que o ministro da Justiça prometeu prender em 24 horas. O descontentamento da opinião pública brasileira era total.

Os generais, reunidos no Ministério da Guerra, exigiram a punição dos criminosos. A reunião demorou duas horas, terminando com a expedição de uma nota lacônica à imprensa. Após a reunião, o ministro Zenóbio dirigiu-se à Vila Militar, zona norte do Rio de Janeiro, onde visitou diversas unidades aquarteladas e falou às tropas e às esposas dos oficiais para "colaborarem para evitar atitudes extremadas de seus maridos na atual conjuntura política". Foi instaurado o Inquérito Policial Militar - IPM sob a presidência do coronel João Adil de Oliveira, tendo como sede a Base Aérea do Galeão, situada na Ilha do Governador.

*Antônio Sérgio Ribeiro é advogado, pesquisador e funcionário da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo.

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