CDH ouve mais denúncias sobre violações aos direitos humanos na USP

Deputados defenderam instalação de CPI pra averiguar abusos
02/12/2014 22:03 | Monica Ferrero - Foto: Maurício Garcia de Souza e Márcia Yamamoto

Compartilhar:

Audiência pública da Comissão de Direitos Humanos<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-12-2014/fg166304.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> . . .<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-12-2014/fg166306.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Nesta terça-feira, 2/12, aconteceu a terceira audiência pública sobre as violações de Direitos Humanos na Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), promovida pela Comissão de Direitos Humanos (CDH) da Assembleia, órgão presidido pelo deputado Adriano Diogo (PT).

Diogo defendeu a necessidade de instalação urgente de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para continuar investigando essas denúncias, pois esse colegiado teria poder para convocar diversas pessoas para depor, incluindo algumas que já ignoraram convites da CDH. Ele também citou as tratativas para que essa comissão seja instalada, pois depende de acordo entre os líderes. O deputado Marco Aurélio de Souza (PT) lembrou que a CPI pode ainda dar mais segurança aos depoentes, pois poderia receber denúncias anônimas.

Adriano Diogo ainda comentou artigo do diretor da Faculdade de Medicina da USP, José Otavio Costa Auler Jr., publicado no jornal Folha de S.Paulo no dia 14/11. No texto, intitulado Direitos Humanos, uma Questão de Saúde, o diretor compromete-se a instalar na faculdade um centro de defesa dos direitos humanos, assim como a campanha Direitos Humanos: uma Questão de Saúde. Segundo a proposta de Auler, a campanha iria permear as ações da faculdade durante todo o ano de 2015, desde a recepção dos calouros.

Porém, na reunião da Congregação da USP do último dia 26/11, houve pressão por parte da reitoria que levou a um recuo. Além disso, o professor Milton de Arruda Martins, que faz parte da Comissão de Sindicância que apura os casos denunciados, foi proibido de se manifestar, o que Diogo considerou "muito grave".



Caoc

Presidente do Centro Acadêmico Oswaldo Cruz (Caoc), Murilo Germano Sales da Silva falou das ações da instituição após as denúncias, que visam pôr à luz para debate os "preconceitos enrustidos" que infelizmente fazem parte da cultura da faculdade e do país. Ele reconheceu que "há questões de polícia que têm de ser apuradas, mas não se pode generalizar".

Questionado pelos parlamentares, o estudante do segundo ano da FMUSP negou que o Caoc patrocine trotes violentos, afirmou que nunca, pessoalmente, foi agredido ou presenciou agressão de qualquer tipo, e disse não ter conhecimento das ações do Show Medicina, instituição à parte do centro acadêmico.

Presidente eleito do Caoc, Renato Pignatari expôs a intenção da instituição de atuar, a partir de 2015, na mudança da cultura e no debate dos direitos humanos. Por isso, apóiam as demandas do Coletivo Feminista Geni e do Núcleo de Estudos em Gênero, Saúde e Sexualidade (NEGSS), respondeu para a deputada Beth Sahão (PT).

Aluno do segundo ano, ele disse não ter sofrido trote, nem sido pressionado a participar de atividades. Contou que, em 2014, participou da recepção de calouros, ocasião em que os veteranos vestiam batas verde-limão para serem facilmente localizados para receber denúncias em caso de abuso. Respondendo à pergunta do deputado André Soares (DEM), Pignatari disse que os membros do Caoc são voluntários e que as rendas são obtidas pelo serviço de xerox e venda de produtos, além das festas.



Assédio e estupro

Ex-aluna de Farmácia e Bioquímica e funcionária do laboratório da USP há 20 anos, Sheila Serra Vieira, respondendo a questionamento da promotora de Direitos Humanos Paula de Figueiredo Silva, contou episódios de assédio moral que sofreu por parte de professores e colegas funcionários por conta de sua orientação sexual. Falou ainda do uso de drogas controladas em festas, substâncias que podem ser encontradas no laboratório, cujo acesso é restrito a alunos da área médica e funcionários da USP e do Hospital das Clínicas.

A advogada Marina Ganzarolli disse que a violência contra a mulher é uma prática reiterada, e que as diretorias das faculdades se omitem, quando não criminalizam as vítimas. Participante do Coletivo Feminista, citou os casos de estupro denunciados, o último ocorrido há duas semanas. Clamou para que o Estatuto da USP seja mudado para que sejam previstas sanções mais firmes, que levem até a jubilação de agressor.



Racismo e misoginia

Estudante de psicologia da USP de Ribeirão Preto, Yasmin Teixeira disse que os alunos da faculdade de medicina sempre causam problemas. Citou o Cancioneiro, livreto com músicas da bateria daquela faculdade, a Batesão, que tem letras de teor misógino, homofóbico e racista e que é incluído no kit vendido, há 20 anos, a calouros. Ela considerou insuficientes e racistas as notas explicativas divulgadas a esse respeito pelo diretor da faculdade e pelos organizadores da bateria.



2015, ano de debate

Um dos diretores do DCE da USP, Gabriel Lindenbach afirmou que a entidade têm recebido denúncias de violência sexual, racismo e homofobia vindas de todos os campi da USP, principalmente após o início destas audiências na Alesp. Segundo ele, há pressão institucional para que não sejam feitas denúncias, por isso, embora a congregação tenha se recusado a fazer de 2015 um ano de debate sobre os direitos humanos, os estudantes o farão. Para Lindenbach, o problema não são o álcool e as drogas recreativas usadas em festas, mas os fármacos usados para adulterar as bebidas alcoólicas de terceiros.

O estudante da FMUSP Felipe Scalisa, que denunciou os casos de violência à CDH, reclamou que está sendo agredido e ameaçado desde que o Caoc abriu consulta sobre sua candidatura à Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina (Denem). Falou ainda que o Caoc cede espaço ao Show Medicina, e se omite sobre vandalismo praticado contra as instalações.

Monica Mendes Gonçalves, aluna da faculdade de Saúde Pública, contou ter sido barrada em festa da USP por ser negra. Assim como os depoentes anteriores, defendeu a instituição de cotas na USP e na Unicamp.

Foram mostrados na audiência um depoimento em vídeo do médico Drauzio Varella condenando os atos de violência na USP e um filme contendo imagens de trote violento e trechos do Show Medicina de 2014, que teve como tema a Ópera do Malandro. A encenação da música Geni e o Zeppelin no palco foi considerada pelo presidente Adriano Diogo uma afronta ao coletivo feminista e uma deturpação da obra. Participaram ainda da audiência os deputados Bruno Covas, Hélio Nishimoto e Carlos Bezerra Jr. (todos do PSDB).

alesp