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Crise no abastecimento de água em debate na Assembleia

Especialistas preveem que falta d"água persistirá por dois ou três anos
05/02/2015 23:01 | Da Redação: Keiko Bailone Fotos: Vera Massaro

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Carlos Giannazi<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-02-2015/fg167340.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> À mesa estão ativistas, representantes da sociedade civil e especialistas em recursos hídricos<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-02-2015/fg167341.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Antônio Carlos Zuffo, professor do Departamento de Recursos Hídricos da Unicamp e Marta Lu, ativista ambiental <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-02-2015/fg167342.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Debatedores alertam que a crise hídrica  pode durar de 2 até 3 anos<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-02-2015/fg167343.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Ivan Valente critica a regulamentação do Código Florestal que permite o desmatamento de matas ciliares <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-02-2015/fg167344.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> José Roberto Kachel, ex-funcionário da Sabesp, afirma que houve retirada de um volume maior de águas do Sistema Cantareira <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-02-2015/fg167345.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Público lota auditório Franco Montoro, na audiência sobre a crise hídrica <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-02-2015/fg167346.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Ativistas do meio ambiente, funcionários da Sabesp e um professor de Recursos Hídricos reuniram-se nesta quinta-feira, 5/2, em audiência, presidida pelo deputado Carlos Giannazi (PSOL), para debater a crise hídrica que afeta o Estado de São Paulo. Na abertura dos trabalhos, Giannazi lembrou que, durante todo o ano de 2014, denunciou a "irresponsabilidade do governo estadual em relação à questão da água", seja por requerimentos solicitando informação ou de convocação do secretário de Recursos Hídricos e da ex-presidente da Sabesp, Dilma Pena.

O primeiro a se manifestar foi José Roberto Kachel, ex-engenheiro da Sabesp, empresa onde trabalhou por mais de 30 anos. Fazendo comparação com o orçamento familiar, explicou que a Sabesp começou a retirar, a partir de janeiro de 2014, um volume maior de água do Cantareira, ou seja, mais de 20% - 750 milhões de metros cúbicos " para uma entrada de 7%. "Resultado: gasta mais do que ganha, não se sustenta", resumiu.

Além disso, acrescentou, a média anual de chuvas nos dois últimos anos foi muito abaixo da média. "A quantidade de água que chega às represas caiu absurdamente em três anos; um fenômeno inesperado! Por essa razão, não poderia ser retirado o que se retirou do Cantareira", repetiu. Segundo ele, desde outubro de 2013, se já tivesse havido uma redução, o cenário que se apresenta poderia ser diferente, ou seja, esgotamento total do chamado "volume morto" do sistema Cantareira em abril deste ano. "A Sabesp sempre se preparou para o melhor, não para o pior. A Sabesp retirou mais do que devia por adotar cenários otimistas demais".

Construída para períodos de seca

Antônio Carlos Zuffo, professor do departamento de Recursos Hídricos da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Unicamp, contou que o Sistema Cantareira foi idealizado na década de 60, justamente quando o Estado de São Paulo atravessava um período de baixas precipitações. E isso já vinha ocorrendo há 30 anos. Explicou que, na época, a maioria da população era rural e devido à falta de água para a agricultura, começou a migrar para a área urbana.

"Nas décadas de 60 e 70, a cidade de São Paulo crescia demais e somente 50% da população era atendida com água tratada e saneamento básico. Os demais cidadãos viviam na base de água de poço e fossas. A contaminação era muito alta e isso acelerou a construção do Cantareira", esclareceu.

Na década de 50, segundo explanação de Zuffo, o consumo per capita era de 450 litros por pessoa. Hoje a média chega a 200 litros. Gastava-se mais água e a economia desse bem, ao longo dos anos, esteve estreitamente ligada à revolução tecnológica. "As válvulas de descarga eram de 20 litros e hoje são de seis. Houve aumento de produção e redução de consumo", disse.

Zuffo explicou que a função de um reservatório é guardar água para usar quando estiver faltando. Portanto, "a gestão do Cantareira é de altíssimo risco, porque se retirava mais água do que o sistema tinha a reter".

Ao comentar alternativas debatidas por outros especialistas, opinou que há a possibilidade de a Billings fornecer água para São Paulo e que a Sabesp tem a tecnologia necessária para tratar o esgoto dessa represa. "Por isso a transferência da Billings para o Alto Tietê", confirmou. No entender de Zuffo, a água bruta serviria para descargas. Água para beber teria que se buscar a granel. "É uma opção melhor do que ficar sem água alguma".

O professor da Unicamp traçou um futuro sombrio para os próximos três ou quatro anos, quando a precipitação de chuvas tende a diminuir. Além disso, lembrou, à crise da água seguir-se-á a da energia. "Se não chover a cântaros em fevereiro e março, o que nos espera é essa situação mais grave", reiterou, esclarecendo que em dezembro e janeiro houve 45% das precipitações esperadas contra a média de 79,4% em anos anteriores.

Zuffo explicou ainda que as chuvas que ocorrem em frentes frias, embora não cheguem ao volume morto, enchem reservatórios, pois, apesar de fracas, são constantes. As tempestades de verão, ao contrário, só causam estragos em centros urbanos.

Faltou planejamento

Ao abordar a questão da crise de água, o deputado federal Ivan Valente (PSOL) criticou os governos estadual e federal, os quais, ao invés de visualizar o futuro, pensaram a curto prazo e não tomaram providências no período de bonança. Referiu-se à lei de sua autoria, sancionada há 20 anos pelo então governador Mário Covas, de recomposição de todas as matas ciliares. Entretanto, lamentou, a regulamentação do Código Florestal que revogou essa lei estadual. "Houve pressão da indústria do agronegócio", afirmou.

Valente criticou também o índice de 30% de perda de água potável, desperdício alto se comparado à média de países como Japão, 3%, e Europa, 7 a 10%, e denunciou o descumprimento da lei de cobrança da água pela indústria e agricultura. Lembrou, ainda, que o bombeamento do esgoto para a Billings já havia sido proibido, mas continuou e agora há o risco de contaminação das pessoas que vão utilizar a água dessa represa.

"A população precisa se organizar e protestar, porque a água é um direito do cidadão e não uma mercadoria", assinalou.

"A fartura da água traz solidariedade e a falta dela gera conflito". A frase é de Marussia Whately, do Instituto Sócio-ambiental (ISA), que falou sobre os objetivos da coalizão Aliança sobre Água, surgida a partir do envolvimento de mais de 500 organizações em busca de alternativas para a crise da água. Ao se referir à situação atual, Whately disse que "não é preciso mais água; é preciso usar melhor a água".

Afirmou que a Aliança definiu três princípios: a de que água não é mercadoria, mas sim um bem à vida, sendo o acesso à água potável um direito humano; a de que todos os governos têm responsabilidade sobre a água, mas estão a serviço da população; e, por fim, que as soluções devem, obrigatoriamente, incluir a recuperação e recomposição das fontes de água.

Explicou que a partir desses princípios, a Aliança defende uma força-tarefa integrada por governantes das três esferas, ou seja, Executivo, Legislativo e Judiciário, além da sociedade civil, para se organizar e enfrentar o que está por vir. "Isso significa não poluir mais os rios Pinheiros, Tietê e a represa Billings", destacou, alertando também para a questão da segurança hídrica. Ou, em outras palavras, risco da dengue, devido ao armazenamento descuidado da água, por falta de transparência nas informações governamentais. Whately alertou ainda para a necessidade de tabelamento da água potável e dos caminhões pipa, e, no tocante a este ponto, cobrou ação dos parlamentares paulistas.

"A culpa não é de São Pedro", afirmou Francisca Adalgisa da Silva, presidente da Associação dos Profissionais Universitários da Sabesp, clamando a sociedade para "levantar voz e buscar uma solução, sem ficar presa à velha ideologia paternalista". Para ela, "nós não estamos vivendo uma crise hídrica. Estamos tendo a resposta da natureza ao nosso desmatamento, à poluição", observou. Reafirmou, como os demais, que o período difícil perdurará por anos, e conclamou a sociedade a lutar pela Sabesp, "sucateada por falta de gestão, mas ainda um patrimônio do Estado".

O caso de Itu

Andreia Bianchi, líder do Coletivo Juntos, relatou aos presentes a experiência enfrentada pelos moradores da cidade de Itu, interior de São Paulo. "Vocês já imaginaram o que é ficar quatro dias sem poder dar descarga?", começou, ao contar que esse município enfrenta o racionamento desde 2014.

A falta de água, segundo ela, acabou por provocar manifestações espontâneas e, assim, cerca de 70 organizações reuniram-se, após concluir que a crise hídrica não resulta de problemas estritamente ambientais. Em nome do Coletivo Juntos, Bianchi listou como prioridades o combate ao desmatamento e preservação de mananciais; o congelamento dos preços da água nas distribuidoras e caminhões pipa para que a população mais carente também tenha acesso à água potável; acabar com a evasão de água, algo em torno de 30%, em vez de construir obras que demorarão a surgir; distribuição, pela Sabesp, de caixas d"água; e evitar demissões que poderão surgir devido à escassez de água.

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