"A proposta da Assembleia Legislativa foi realizar um evento de conteúdo prático, com o objetivo de evitar que os prefeitos e gestores sejam alvo de demandas na Justiça por falta de informação", resumiu o presidente do Parlamento paulista, deputado Fernando Capez, na abertura do 1º Ciclo de Palestras sobre Contas de Gestão Pública e Regras Eleitorais, realizado nesta quinta-feira, 1º/10, no plenário Juscelino Kubitschek. O encontro reuniu prefeitos e gestores municipais de mais de 200 cidades. É frequente que a atuação dos prefeitos leve à abertura de processos, mesmo que eles tenham agido de boa-fé. Além de disseminar informação, o ciclo de palestras abordou o "mal do século 21, que tem travado o nosso desenvolvimento: a insegurança jurídica. Não é possível continuar num cenário de imprevisibilidade jurídica", complementou Capez. Para o procurador-geral de Justiça, Márcio Fernando Elias Rosa, não há confronto entre o Ministério Público e os políticos. "Mas não desconheço as relações às vezes tensas entre o Ministério Público e os gestores públicos. Elas não nos agradam, e têm sido alimentadas por equívocos de atuação, mas sobretudo por um discurso oportunista em relação à classe política ou ao Ministério Público". A segurança jurídica demandada por Capez se beneficiará, segundo Elias Rosa, a partir de uma relação institucional propositiva. Para isso, ele defendeu maior aproximação e diálogo entre as procuradorias municipais e os promotores. Judicialização desnecessária A falta de um diálogo institucional leva à judicialização desnecessária, corroborou o advogado Leonardo Henrique de Cavalcante Carvalho, que ocupa, por indicação do Senado, vaga no Conselho Nacional do Ministério Público. Ele narrou o que considera um caso típico do dilema entre gestores e Ministério Público, representado por um prefeito mato-grossense que foi instado pelo Ministério Público a construir muro em uma escola, sob pena de responder judicialmente por medidas não tomadas. O prefeito alegava não dispor de recursos para a obra, mas fez o muro. Cerca de dois anos depois, um novo promotor identificou que a fonte de recursos para a construção do muro não era adequada, o que tornava o prefeito sujeito a uma ação por improbidade administrativa. "O Ministério Público não deve atuar como ilhas isoladas", ele observou. Como medida prática, Carvalho propôs a criação, para os promotores de Justiça, de cursos que contenham um módulo sobre relações institucionais. Definindo seu pronunciamento como um "desabafo", o presidente da Associação Paulista de Municípios, Marcos Monti, criticou o pacto federativo, "que destina apenas 15% das receitas tributárias aos municípios, que são na verdade os que mais prestam serviços ao cidadão". Ele também citou um exemplo, neste caso o da cidade de Itapuí, que recebeu ofício do Tribunal de Justiça determinando que nos próximos cinco anos 25,6% do orçamento municipal seja destinado ao pagamento de precatórios. "É impossível que ¼ do orçamento seja para essa finalidade", ressalvou. Na avaliação de Monti, o palco para a resolução dos problemas que afligem municípios é o Congresso Nacional. "E se continuar essa pressão sobre os prefeitos, teremos cada vez menos gente de bem querendo participar da vida pública", arrematou. Orientações para administradores públicos O Tribunal de Contas do Estado, órgão fiscalizador de 644 municípios paulistas, tem feito esforços para orientar os administradores públicos quanto à ocorrência de erros em suas gestões, afirmou a presidente do TCE, Cristiana de Castro Moraes. "É muito importante esse papel didático, porque prevenir um gasto irregular é mais eficiente que puni-lo", completou. Além de ciclos de palestras, Cristiana citou entre as iniciativas do TCE para incrementar o relacionamento com as prefeituras as auditorias concomitantes, realizadas três a quatro vezes ao ano em algumas cidades, de modo que "não esperamos acabar a gestão para analisar seus dados contábeis". A presidente do TCE informou ainda que na próxima segunda-feira, 5/10, será lançado o Primeiro Anuário de Desempenho Municipal, com a divulgação do Índice de Efetividade da Gestão Municipal. Este, formado a partir dos indicadores educação, saúde, meio ambiente, planejamento, gestão fiscal, cidades protegidas e tecnologia da informação, permitirá que "cada prefeito tenha um perfil de sua cidade e dos pontos que estão merecendo atenção". Primeira palestra Na primeira palestra do dia, o desembargador André Lemos Jorge, do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, destacou a necessidade de uma discussão sobre as modificações eleitorais propostas pela Lei 13.165, sancionada em 29 de setembro último. "Esse debate institucional pode começar agora, abrindo-se um diálogo com a magistratura e o Ministério Público locais", disse Jorge, ao lembrar que o TRE é um órgão recursal, cabendo decisões ao juiz da comarca e ao promotor da cidade, que atuam como juiz eleitoral. Como a lei traz disposições contraditórias, não é incomum que comarcas vizinhas tenham decisões diferentes a respeito de questões semelhantes. O desembargador observou ainda que metade dos problemas que deságuam no TRE se deve à falta de experiência em campanhas eleitorais. Por isso, ele aconselhou que candidatos procurem advogados e contadores que militam nessa área. Os problemas podem se agravar porque "a legislação eleitoral é muito dispersa em leis e resoluções, com frequência feitas de afogadilho".