Muitos dos problemas do sistema prisional do Estado chegam à Assembleia Legislativa na forma de denúncias. A partir desse fato, a deputada Márcia Lia (PT), ouvidora do Parlamento paulista, organizou a audiência pública sobre o sistema penitenciário estadual, que reuniu representantes de diversos órgãos ligados ao tema nesta quarta-feira, 22/6, no auditório Teotônio Vilela. "Estou há dois meses e meio na Ouvidoria e fiquei perplexa com as denúncias que chegaram a mim, muitas delas sobre a violações de direitos humanos no sistema prisional", disse a parlamentar, que frisou problemas como a revista íntima de visitantes e a superlotação nos presídios. Ela propôs a criação de um grupo de trabalho para buscar coletivamente soluções para o setor e, dada a ausência das autoridades convidadas para o debate, concluiu: "A luta será longa e difícil". Violação de tratados internacionais A falta de atenção para o tema faz com que o "debate sobre direitos humanos pareça uma ilha", concordou Rildo Marques, presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe). "A política para o sistema prisional está em desacordo com a legislação vigente, inclusive com tratados internacionais de que o país é signatário", ele alertou. Isso, além de se refletir sobre os encarcerados, "deixa os funcionários em situação de risco e abandono, e os familiares em desespero". Marques criticou a onda conservadora que, a partir de 2010, influenciou o debate sobre o tema e as propostas de privatização do sistema. "Querem que políticas públicas e direitos humanos virem mercadoria. O sistema prisional não vai ter um tratamento mais humano com esse tipo de gestão", concluiu. Relatório do Condepe Também integrante do Condepe, Cheila Olalla é relatora da Comissão do Sistema Prisional instalada pelo conselho. O relatório, que começou a ser construído em 2014 e está em fase de conclusão, traz como principais denúncias a superlotação, a solicitação aleatória de transferência de presos, torturas e maus-tratos, falta de auxílio jurídico, má alimentação, constrangimentos na revista íntima de familiares e problemas de saúde dos encarcerados. "Os principais responsáveis por essa situação são os operadores do direito, que devem ser chamados a sua responsabilidade", opinou o defensor público Bruno Shimizu. Para ele, o país adotou uma política de encarceramento em massa que é parte de uma matriz ideológica que transforma a prisão numa panaceia. "Em nenhum lugar do mundo se mostrou que o preso sai da penitenciária melhor do que quando entrou", disse. Shimizu remeteu ainda a uma reportagem publicada por uma revista de curiosidades e ciências segundo a qual, mantido o atual ritmo de encarceramento, em 2065 toda a população do país estaria atrás das grades. A maneira como agentes penitenciários e familiares de presos veem a questão também ganhou espaço no debate. "A situação agente penitenciário hoje é crítica: somos o primeiro escudo entre o Estado e o preso", afirmou Daniel Grandolfo, presidente licenciado do Sindicato de Agentes de Segurança Penitenciária do Estado de São Paulo (Sindasp/SP). O preconceito contra os agentes, o pequeno número de funcionários para um grande número de presos geram ameaças de lado a lado, opinou Grandolfo. "Além disso, o governo quer dar ao agente penitenciário uma responsabilidade que não é dele: a de ressocialização do preso. É preciso contratar pessoas capacitadas para essa tarefa complexa", acrescentou. "Eu entendo que o trabalho de vocês é árduo, mas não podem descontar em cima dos familiares", afirmou Elenita Sabadin, presidente da Associação de Familiares e Amigos de Presos e Egressos de São José dos Campos. "Nós não fomos condenados, e estamos ali para ajudar o preso a ser reeducado." Más condições de alimentação, uso restritivo da água e revista íntima também foram destacados por Elenita como problemas que presos e familiares enfrentam.