ORA, O BONIFÁCIO! - OPINIÃO

Milton Flávio*
10/07/2001 11:46

Compartilhar:


Um antigo político mineiro, o ultraconservador Zezinho Bonifácio, costumava dizer que todo sujeito de bem era comunista até os trinta anos. Depois dessa idade, se tivesse responsabilidade, transformava-se num capitalista empedernido - obrigado que estava a sustentar a família e a pensar no futuro dos filhos. Hoje, não faz nenhum sentido sentar-se à mesa de um bar e passar horas discorrendo sobre as eventuais virtudes do comunismo sobre o capitalismo ou vice-versa. Pela simples razão de que a vitória deste regime sobre o outro é incontestável. Só não a admite quem tem a cabeça nas nuvens ou é doente dos pés.

Antes que os patrulheiros de sempre atirem a primeira pedra, o autor destas linhas gostaria de ressalvar que nunca teve o prócer da Arena como um de seus ídolos, nem fez de suas máximas leitura de cabeceira. Agora, é preciso reconhecer que Zezinho Bonifácio não estava de todo errado. Há de se admitir seu pragmatismo. Nada mais natural que um jovem chefe de família abandone os versos ruins, vendidos de mesa em mesa, em troca de uma ocupação mais rentável. Afinal, além de não pagar contas, poesia é coisa para poucos, só para os muito talentosos e abnegados. O distinto público, a família e a Literatura, sinceramente, agradecem o fim de tantas vocações não realizadas.

Não se trata de negar o direito às ilusões, mas, sim, de não fechar os olhos a um fato inquestionável: o de que, cedo ou tarde, a realidade se impõe, estabelece limites, obriga-nos a definir prioridades e a ser mais humildes. Até porque a arrogância é péssima conselheira. Isso ocorre em todas as atividades humanas. Na política, não é diferente. Não se trata de abrir mão dos sonhos, mas de não ignorar que sem feijão eles não se sustentam por muito tempo.

As recentes pesquisas de opinião sobre o desempenho dos novos prefeitos e governadores das principais capitais e Estados brasileiros mostram isso. Basta correr os olhos na relação dos que contam com a maior aprovação e a maior rejeição por parte dos eleitores, para perceber que no topo e na base dos dois rankings há representantes de todos os partidos. O que revela, entre outras coisas, que os cidadãos estão cada vez mais pragmáticos, maduros, que não se deixam mais levar por simples jogadas de marketing.

Descontentes com o desemprego e irritados com a crise energética, eles apontam Lula como o favorito na corrida presidencial. Mas rejeitam as administrações de Marta Suplicy e de Olívio Dutra, justamente aqueles que o PT imaginava que seriam os principais manequins de sua vitrina. E por que Marta e Olívio estão com cotação tão baixa diante dos seus respectivos eleitores? Há explicações para todos os gostos. Talvez porque ambos exageraram - por má-fé ou ingenuidade - em suas promessas de campanha. Talvez porque ambos, no governo, estejam fazendo o contrário do que prometeram no horário eleitoral gratuito. Seguramente porque ambos se dedicaram mais a bravatas e factóides que a combater a febre aftosa e a sujeira das ruas e praças. Patrocinar os "pisões" de Jose Bové rende boas fotos e imagens, mas não enche barriga. Brincar de pintora de muros pode ser divertido, mas não melhora o trânsito nem impede o aumento da tarifa de ônibus.

E o Bonifácio com isso? Ora, o Bonifácio podia ser reacionário, mas de bobo, convenhamos, ele nada tinha.

*Milton Flávio é deputado estadual pelo PSDB e presidente da Comissão de Assuntos Internacionais da Assembléia Legislativa de São Paulo

alesp