Opinião - Qual o preço do bolo?


30/08/2011 12:48

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Considerado um dos países mais "festivos" do mundo, o Brasil está se preparando para um dos eventos esportivos mais badalados do planeta, a Copa da Fifa. Gostaria de destacar o termo "da Fifa" porque, na verdade, é ela a entidade maior do futebol que ditas as normas, manda e desmanda e, finda a competição, vai embora com os louros e os cofres abarrotados. E o que ela deixa aos países que sediaram a competição?

A pergunta, se respondida de imediato, soará com alívio: deixará estádios modernos, mudanças e investimentos na infraestrutura das cidades. E também recursos arrecadados com os impostos trazidos pelos turistas. Mas, isso é tudo? Confesso que não, não é tudo.

Reconheço que é desagradável e antipático perguntarmos o preço do bolo, em plena festa. Mas, é exatamente na festa que os espíritos estão despreparados e, no auge da alegria, muitas perguntas poderão deixar de ser feitas, ou poderão ser respondidas usando-se o filtro do interesse para que a verdade não venha a público.

Qualquer pessoa que conheça um pouco de periferia sabe o quanto é difícil a vida quando se procura por escolas de boa qualidade, saúde pública eficiente, segurança e transporte coletivo dignos, em todas as cidades brasileiras.

Houve um tempo em que no ensino predominava a língua dos três "P", que classificavam as escolas particulares: "papai pagou passou". A alusão mostrava o nível muito mais elevado das escolas públicas, em relação às particulares. Na saúde pública, tínhamos o Samdu, que se não fosse uma maravilha, era muito melhor do que temos hoje.

Cada categoria profissional tinha a sua previdência: IAPI, IAPTEC, IAPB, IAPC. A segurança pública tinha apenas o reforço dos inspetores de quarteirão e os guardas noturnos com os seus insistentes apitos. É poética a minha colocação? Pode ser.

Com o movimento de 1964, os convênios médicos ganharam força, ao mesmo tempo que a saúde pública foi se definhando. A escola pública perdeu qualidade, os professores perderam salários, e desapareceu o velho ditado de que "casamento com professora era sorte grande, porque as mestras eram bem remuneradas...".

A segurança pública chegou ao ponto em que está hoje: o tráfico popularizou o consumo da droga, e cresceu o número de empresas de segurança, a maioria delas tendo policiais na retaguarda, ou na direção.

Comecei falando de futebol e derivei para esses pontos. E a justificativa é simples: será que temos, de fato, condições de receber uma copa do mundo de futebol? Quem, além da Fifa e das empreiteiras, tem interesse nessas obras? A exiguidade de tempo não seria mais um argumento para que se fechem os olhos para as licitações suspeitas? Quem vai pagar o custo disso? Quem vai sair ganhando com a copa? Não seria melhor gastarmos esses recursos nos setores mais carentes, como saúde pública, ensino, transporte e segurança? Até quando estaremos aceitando as condições da FIFA e a conivência da CBF? Será que o Ministério Público não poderia se aproximar mais, e olhar de perto o que está sendo feito? Quais os caminhos que esses recursos estão trilhando?

Como se vê, em plena festa, estamos perguntando o preço do bolo. Sabemos que é muito alto. Mas o pior é que, no final, ele será enormemente indigesto para todos nós, que pagamos impostos.



*Vitor Sapienza é deputado estadual (PPS), presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia e Informação, ex-presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, economista e agente fiscal de rendas aposentado

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