CÉSAR MARTA - OPINIÃO

Milton Flávio*
07/02/2001 15:16

Compartilhar:


"Perdão", ensinou mestre Lupicínio Rodrigues, "foi feito para a gente pedir". Pedir não é feio; feio é roubar, diz o dito popular. Nesse sentido, não há por que condenar os esforços da prefeita Marta Suplicy, firmemente empenhada em pedir aos empresários ancinhos, pás, tratores, camisetas, sapatos e flores. Tudo para deixar a cidade menos feia e a sede da prefeitura mais alegre. É preciso reconhecer que, de fato, ela não está pedindo nada para si, mas para a imensa massa de desvalidos que habitam São Paulo. Menos mal. Há administradores públicos que, segundo a crônica policial, não pedem nada, extorquem.

Só há um problema: quem se habitua a pedir sempre corre o risco de virar um pedinte profissional, desses que acham que cabe aos outros a obrigação de resolver os seus problemas. Não se pretende aqui negar a importância da solidariedade, das parcerias. Ao contrário. Mas governar exige mais que boa vontade, que discursos politicamente corretos, que jogadas de marketing. Se não, a impressão que fica é a de que o governante, em vez de fazer a lição de casa, cortar na própria carne e assumir o ônus da adoção de medidas impopulares (mas que não podem ser postergadas), joga para a platéia, com um olho na mídia e o outro nos índices do Ibope.

É cedo para fazer um julgamento sobre a administração de Marta Suplicy. Seria leviano. Afinal, ninguém pode resolver tudo de uma hora para outra, ainda mais depois de oito anos de Maluf e Pitta. O que preocupa, no entanto, é uma certa propensão da atual prefeita ao show. No dia seguinte à sua posse, como se recorda, ela ofereceu almoço a moradores de rua. Não fosse a boa vontade de alguns comerciantes da região central, centenas deles teriam ficado chupando o dedo, pois não havia comida suficiente para todos O regalo, no entanto, rendeu boas fotos e imagens. Felizmente, alguém teve o bom senso de não convidar o senador Eduardo Suplicy para chefiar a cozinha. Até onde se sabe, sua breve incursão em acampamento dos sem-terra e numa favela da cidade ainda não lhe deu competência para tanto.

Dias depois do almoço, a prefeita reuniu alguns assessores e amigos para dar uma demão de tinta nos muros do Estádio do Pacaembu. Novamente, belas fotos e imagens, tudo em nome do projeto "Belezura". É de se esperar que nos próximos dias ela saia por aí aparando grama das praças e multando motoristas infratores. Pular guard-rail ela já pulou, sob o pretexto de vistoriar obras de recuperação de uma avenida. Em março, teremos sessões simultâneas de psicodrama em 140 pontos da cidade. Tudo para elevar a auto-estima do paulistano...

Não se pretende negar que a política tem muito de simbologia e que governantes e parlamentares, inclusive por uma questão de sobrevivência eleitoral, procuram ocupar espaços na mídia. Também não se critica o fato de um administrador público manter contato direto com os diversos segmentos sociais, para conhecer seus problemas, ouvir suas propostas, manter, enfim, um pé no mundo real. O problema começa quando o gosto pelo show se sobrepõe ao compromisso de mudar estruturas e de fazer o que precisa ser feito, sem se preocupar com a repercussão imediata na imprensa.

*Milton Flávio é deputado estadual pelo PSDB e líder do governo na Assembléia Legislativa de São Paulo.

alesp