Três milhões sofrem com a falta de água em São Paulo - OPINIÃO

Nivaldo Santana*
09/06/2000 18:04

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Desde o dia primeiro de junho, mais de três milhões de pessoas das zonas sul e oeste da capital sofrem com o rodízio de água. Este infortúnio ocorre na contramão das promessas do governador Mário Covas que, às vésperas das eleições passadas, prometeu à população que o rodízio de água estaria definitivamente afastado do cotidiano dos cidadãos. E agora, como a desmoralizar o discurso do governo, estão sendo apagadas dos carros da Sabesp a inscrição "rodízio nunca mais".

Não é de São Pedro, como quer fazer acreditar a direção da Sabesp, a causa da volta do rodízio. Embora a estiagem seja um fato, outros fatores mais graves explicam o racionamento. Os culpados estão aqui, na terra, administrando uma empresa em crise por mais que sua diretoria teime em negar.

As dificuldades financeiras são a origem da crise. Desde o último acordo do governo brasileiro com o Fundo Monetário Internacional, recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço estão impedidos de financiar empresas públicas de saneamento. Com isto, mais de R$ 1,8 bilhão do FGTS, previstos para financiar o setor, estão contingenciados por imposição do FMI e não podem servir para amenizar as finanças da Sabesp e outras empresas congêneres.

Outras importantes fontes de recursos também estão bloqueadas. A Caixa Econômica Federal e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) privilegiam somente empresas privadas. O Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) também não é mais utilizado para o saneamento. Em 1997, o Conselho Curador do FGTS aprovou o Programa de Financiamento a Concessionários Privados de Saneamento, agravando as dificuldades do setor.

Em 1998, o orçamento do FGTS era de R$ 1,6 bilhão, sendo liberado apenas R$ 233 milhões, o que provocou verdadeira asfixia no setor público. Neste ano, os recursos da CEF e do BNDES foram usados para o Programa de Assistência Técnica à Parceria Público/Privada em Saneamento.

Em virtude dessa conjuntura econômica, a Sabesp é obrigada a recorrer a empréstimos externos - sujeitos a variações cambiais bruscas ou a financiar-se no mercado financeiro doméstico com taxas de juros abusivas.

O resultado é que, em 1999, com a desvalorização do Real, a empresa teve um dispêndio superior a R$ 850 milhões com o pagamento de sua dívida externa e viu-se na contingência de suspender 546 obras e continuar com os cortes de funcionários, salários e benefícios.

Os efeitos deste arrocho não tardaram. Uma das obras que teve seu cronograma atrasado foi a do braço do Taquaquecetuba, que levaria água da represa Billings para a represa do Guarapiranga. Se esta obra tivesse sido concluída em 1988, conforme prometeu a Sabesp, o rodízio de água seria evitado ou, pelo menos, minimizado em seus efeitos.

Fator agravante e ligado ao atraso de obras, foi a demissão de diversas equipes do programa de redução de perdas. Esta situação, associada ao descaso com campanhas educativas contra o desperdício, fez ruir duas peças de propaganda da Sabesp: o fim do rodízio e o alegado saneamento financeiro da empresa.

Para tratar destas questões, protocolamos no último dia 19 de maio, na mesa da Assembléia Legislativa de São Paulo, um pedido de CPI da Sabesp assinado por 40 deputados de onze partidos. Há possibilidades desta CPI ser instalada ainda este mês.

Nossa meta é fazer uma ampla análise da situação da empresa, reafirmar nossa compreensão de que o saneamento deve permanecer como empresa pública, lutar pela liberação de recursos do FGTS para o setor e afastar definitivamente o flagelo do rodízio da vida de milhões de pessoas hoje servidas pela Sabesp.

* Nivaldo Santana é deputado estadual, líder da bancada do PCdoB na Assembléia e funcionário da Sabesp há 22 anos.

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