Opinião: Luz e trevas


01/04/2005 17:48

Compartilhar:


A Luz e as Trevas, em praticamente todas as culturas, são símbolos bem nítidos

do positivo e do negativo, do bem e do mal. A AES-Eletropaulo transformou-se,

com sua decisão de cortar o fornecimento de energia para alguns setores da

Prefeitura de São Paulo, de uma fornecedora de luz em uma concessionária das

trevas. Ficou no ar que a hipótese do gênio do mal inspirador desta decisão

habita o BNDES, órgão do governo federal que detém 49% das ações da empresa.

A suspeita de que houve uma pressão subterrânea do BNDES para forçar a

AES-Eletropaulo a tomar esta atitude, inusitada e arbitrária, é inquietante

para todos. A principal vítima, como sempre, é a população, que não pode

contar com os serviços públicos de diversas repartições, inclusive das

Unidades Básicas de Saúde.

Por si só, a atitude arbitrária da empresa demonstra profunda falta da

responsabilidade social que se espera de uma concessionária de serviço

público. Não é admissível que a "retaliação" da AES-Eletropaulo vise atingir

os cidadãos, prejudicando-os em seus direitos fundamentais e fazendo cessar

serviços essenciais. Ainda mais quando esta comunidade é credora da AES com

relação ao Cosip " taxa cobrada de todos os cidadãos para a iluminação

pública e que deveria ter sido repassada à prefeitura, mas vem sendo retida

pela empresa. Esta retenção, por sinal, é um dos principais motivos da

Prefeitura não ter chegado a um acordo sobre a dívida anterior.

Como agravante, certamente nenhuma empresa privada trataria com rigor

desmesurado o seu principal cliente, responsável por significativa fatia de

seu faturamento, em um momento de dificuldade. Ainda mais quando se está há

menos de três meses sob uma nova administração que tem como uma de suas

grandes metas justamente o saneamento financeiro e a redução dos déficits e

dívidas.

A isto deve-se acrescer o fato de tal comportamento sequer ter precedentes, já

que na administração anterior períodos muito superiores de atraso jamais

foram penalizados da mesma forma brutal. As razões para este tratamento

diferenciado fogem à compreensão de qualquer lógica, já que não faz sentido

algum comparar uma administração que passou quatro anos sendo inadimplente

contumaz com outra que mal tomou pé da situação e manifestou sua vontade de

saldar o débito, tendo a seu favor ainda, os repasses do Cosip não

realizados.

Parece faltar, desta forma, uma explicação razoável para a inusitada ação da

empresa. E a suspeita levantada pela Prefeitura " de interferência do BNDES "

fornece um motivo que parece mais plausível que qualquer outro: os objetivos

politico-partidários do PT. Note-se que o banco, reduto de petistas

extremados, é detentor de 49% das ações da empresa, o que lhe confere notável

poder de fogo e pressão sobre a AES.

Independente da suspeita ser fundada ou não, certamente não parece racional

que a AES-Eletropaulo tomasse uma atitude tão radical, que compromete tanto a

imagem da empresa, sem que seu principal acionista fosse sequer consultado,

fosse ele quem fosse. Mais estranho ainda se este acionista fosse um órgão

governamental, ainda que de outra esfera. Será que nenhum executivo da

empresa ouviu as muitas propagandas do PT - curiosa confusão governo-partido

- anunciando que o BNDES tem a intenção de ajudar São Paulo e nem por um

instante imaginou que tal declaração por parte de um acionista da empresa tão

significativo deveria ser consultado sobre uma decisão que afronta

diretamente uma declaração pública?

A suspeita fortalece-se quando se examina a ação do PT ao longo de sua

história e se verifica que esta utiliza muito comumente o poder do Estado em

benefício de seu partido e de seus objetivos eleitorais. Mas me custa

acreditar que esta manipulação do poder em proveito próprio chegaria a tal

ponto e não hesitaria antes de prejudicar uma parcela tão grande da população

em uma empreitada tão desprovida de ética que certamente chocaria até a

Maquiavel. Até mesmo para quem semeia trevas há limites, assim, se espera uma

severa repreensão do BNDES contra a empresa de forma a não perdurarem as

suspeitas de que ação tão tenebrosa partiu justamente de sua cúpula. Também

se espera que o PT seja coerente e, no mínimo, reivindique à AES-Eletropaulo

uma isonomia em relação ao tratamento que era dado à administração anterior.

* Milton Flávio é médico e deputado estadual pelo PSDB de São Paulo.

alesp