Em tempo de micareta

Opinião
13/05/2005 17:41

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Iludem-se os que pensam que, de fato, Lula e o PT mudaram. Crer nisto implica acreditar que ambos evoluíram. Não é verdade. O que um e outro fazem é mudar o discurso de acordo com suas conveniências momentâneas. Durante as comemorações do quinto aniversário da Lei de Responsabilidade Fiscal, diversos petistas vieram a público, sem qualquer cerimônia, com a fantasia que lhes convinha naquele momento: recém convertidos à austeridade fiscal. Quase todos fizeram um mea culpa por terem, quando congressistas, há cinco anos, votado contra a nova legislação. Fizeram mais, à época: foram à Justiça para tentar derrubá-la no tapetão.

Hoje, eles se dizem arrependidos. Não há motivos para acreditar em suas palavras, já que suas ações caminham no sentido inverso. É certo que o atual ministro da Fazenda, um dos que votou contra a LRF, faz das tripas-coração para manter o superávit primário na casa dos 4,25% do Produto Interno Bruto. Para tanto, corta investimentos em infra-estrutura e verbas de setores fundamentais para a população. Mas, na prática, ele enxuga gelo. Sob o comando de Lula e José Dirceu, o governo só faz aumentar os gastos com a contratação de funcionários " inclusive daquela pequena multidão que, via dízimo, ajuda a engordar o caixa do PT e aumentar a venda de charutos cubanos no país ", com viagens, estadias e cartões (de crédito) corporativos.

Para quem criticava, com a veemência e ligeireza que alguns aditivos costumam dar aos que deles abusam, as despesas com a terceirização de serviços na gestão FHC, é no mínimo estranho que tais gastos tenham crescido nos dois últimos anos 52%. Tão estranho quanto o fato de que, no período, o número de funcionários vinculados diretamente à Presidência da República tenha aumentado 20%.

Mas, no quesito irresponsabilidade fiscal, a grande obra petista fica por conta da gestão Marta Suplicy à frente da Prefeitura paulistana. E olhem que " os jornais registram isso, fartamente " não foram poucos os líderes petistas que, durante a campanha eleitoral do ano passado, não se cansavam de repetir que a administração da ex-prefeita era um "patrimônio do partido".

Não nos custa reproduzir algumas manchetes dos principais jornais nos últimos dias. Em nome da memória e do profundo apego do PT à austeridade fiscal.

"Marta é acusada de improbidade". Folha de S. Paulo, 10 de maio de 2005.

R$ 590 milhões. Este é o montante que, segundo o Ministério Público, a ex-prefeita gastou em 2003, sem que tivesse o dinheiro em caixa. Detalhe: aqui, não se está fazendo referência ao rombo por ela provocado em 2004, último ano de sua gestão.

"Pressa fez preço dos túneis dobrar". O Estado de S. Paulo, 5 de maio de 2005.

Números finais dos dois túneis que a ex-prefeita inaugurou pouco antes das eleições, cujas obras estão sendo refeitas, mostram que eles custaram o dobro do projetado.

Que uma coisa, no entanto, fique bem clara. A admiração da cúpula petista pela gestão de Marta Suplicy vai além dos elogios feitos dos palanques e nas entrevistas. É real. Tanto é que o governo não teve nenhum constrangimento em editar uma Medida Provisória e passar por cima da LRF (dela mesmo, agora tão elogiada pelos petistas) só para encobrir mais uma irregularidade cometida pela administração que é "patrimônio do partido".

E assim eles prosseguem, trocando de convicções, substituindo as fantasias. Em ritmo de micareta.



*Milton Flávio é professor de Urologia da Faculdade de Medicina da Unesp (Botucatu) e deputado estadual pelo PSDB-SP

miltonflavio@al.sp.gov.br

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