REPRESSÃO NÃO TRAZ SEGURANÇA ÀS ESCOLAS - OPINIÃO

Hamilton Pereira*
14/05/2002 11:10

Compartilhar:


Dois fatos recentes abalaram a comunidade escolar de Sorocaba. O primeiro aconteceu no dia 9 de abril, na Escola Estadual Dulce Esmeralda Basile Ferreira, no Parque São Bento. Um aluno de 16 anos foi ferido com um tiro na cabeça. O segundo caso, ocorrido dez dias após na Escola Estadual Antônio Cordeiro, no Parque das Laranjeiras, acabou em tragédia. Uma estudante, de 17 anos, foi assassinada numa briga entre o seu ex e o atual namorado.

Esses acontecimentos irão engrossar as estatísticas sobre a violência nas escolas. Estudo recente da Unesco, órgão das Nações Unidas para a educação, ciência e cultura, feito em 14 capitais brasileiras, chegou à seguinte conclusão: na maioria das escolas - públicas ou privadas - os alunos sentem-se tão inseguros nas salas de aula quanto nas ruas. Em São Paulo, 50% dos professores relataram algum tipo de agressão sofrida. Os casos mais graves, como homicídios, ocorrem geralmente em colégios da periferia. Já nos de elite os maiores problemas envolvem usuários de drogas.

O dado da pesquisa que mais chamou a atenção refere-se ao impacto sobre o aproveitamento escolar dos alunos. Metade dos que convivem com a violência não consegue concentrar-se nos estudos. A outra metade está dividida entre os que perdem a vontade de ir à escola e os que ficam estressados. O abandono dos estudos tem na violência uma das causas principais.

Esse estudo corrobora pesquisa feita periodicamente pelo Sindicato de Especialistas em Educação do Magistério Oficial do Estado de São Paulo (Udemo), junto a professores, funcionários e alunos das escolas estaduais. Em 90% delas aconteceram brigas envolvendo alunos, e em 5% ocorreram mortes.

Outra pesquisa divulgada neste mês, da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação - CNTE, filiada à Central Única dos Trabalhadores - CUT, revela, entre outros dados, que nas escolas públicas do Estado há consumo esporádico de drogas nas proximidades de 35,2% delas. Já o tráfico de entorpecente ocorre no interior de 9,4% delas; em 8,2% foram encontradas armas de fogo e em 26% armas brancas (estiletes e facas).

Para combater a violência nas escolas, o governo anunciou em 2001 que investiria em torno de R$ 15 milhões para dotá-las de câmeras de vídeo e alarmes. Em Sorocaba, conforme a imprensa local noticiou, 39 das 82 escolas estaduais sediadas no município estariam recebendo esses equipamentos. Da forma como está sendo feita, a instalação dos equipamentos tem caráter repressor e punitivo, estimulando a revolta dos alunos, que estão furtando ou destruindo as câmeras que os vigiam e os alarmes que os denunciam, como aconteceu em duas escolas do ABC paulista.

Pressionado pela opinião pública, o Executivo divulgou em 7 de maio passado o Plano de Segurança nas Escolas no valor de R$ 98 milhões. Além de eleitoreiro, pois é anunciado seis meses antes da eleição por um governo que está há sete anos e meio no poder, o Plano é quase todo repressor. Prevê a compra de mais câmeras e alarmes, a aquisição de viaturas policiais, ronda escolar feita por 860 policiais exclusivamente dedicados a esse trabalho e admite até mesmo revista aos alunos e alunas.

Os especialistas em educação criticaram as medidas. Dizem que a proposta combaterá o problema superficialmente, gerando uma falsa sensação de segurança. Para alguns, essas iniciativas irão gerar índices maiores de violência, devido ao constrangimento, humilhação e revolta dos alunos, principalmente em função das revistas.

Além disso, essas medidas têm provocado gastos enormes de dinheiro público. O que falta é um processo pedagógico que vá às causas geradoras de conflitos no ambiente escolar. É o que indicaram, por exemplo, 59% dos professores ouvidos pela pesquisa da Udemo, afirmando que a melhor forma de combater a violência está na promoção de atividades de lazer e cultura.

É exatamente isso - atividades culturais e de lazer - o que prevê a lei n.º 10.312, de minha autoria, que foi parcialmente mutilada pelo governo do Estado. Batizada como "Parceiros do Futuro", vem sendo aplicada lentamente nas escolas nos fins-de-semana sem as equipes multidisciplinares previstas no projeto original.

A idéia da lei é transformar as escolas num espaço aberto, vivo, onde a comunidade passe a zelar por elas como se fossem a extensão de sua casa. Por espaço aberto e vivo entenda-se o funcionamento de equipes multidisciplinares integradas por pais, alunos, professores, diretores, psicólogos e assistentes sociais, entre outros, que desenvolvessem atividades teatrais, espetáculos musicais, práticas esportivas e gincanas culturais.

O governo erra por apostar apenas em medidas repressivas em vez de optar por um projeto pedagógico, como recomendam os especialistas na área. Se isto estivesse acontecendo nas escolas de Sorocaba, a tragédia que vitimou a adolescente de 17 anos poderia ter sido evitada.



*Hamilton Pereira, deputado estadual, é primeiro secretário da Assembléia Legislativa de SP.

alesp