TRISTES CONSTATAÇÕES - OPINIÃO

Nivaldo Santana*
20/03/2001 18:16

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Em 21 de março, o mundo lembra, mais uma vez, o Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial. A data foi estabelecida há 35 anos pela Assembléia Geral da ONU e evoca o Massacre de Sharpeville, na África do Sul, em 21 de março de 1960, quando a polícia local abriu fogo contra ativistas antiapartheid, matando 69 pessoas.

No Brasil, a luta pela igualdade racial parte de um pressuposto legítimo: de acordo com a Constituição brasileira, racismo é crime inafiançável. A lei 7.716/89 prevê pena de dois a cinco anos de reclusão para aqueles que estimulem discriminação ou preconceito de raça, cor e outros. Contudo, na aurora do terceiro milênio, a desigualdade racial persiste, a despeito da lei. Estatísticas revelam a agudez do racismo à brasileira.

O Mapa da População Negra no Mercado de Trabalho, estudo publicado recentemente, denuncia "indicadores sistematicamente desfavoráveis aos trabalhadores negros". Comparados com o restante da população economicamente ativa, os negros iniciam prematuramente no mercado de trabalho e nele permanecem durante mais tempo. O desemprego também possui contornos raciais. Nas seis regiões metropolitanas do Brasil, metade dos desempregados pertence à raça negra.

A cor da pele pesa ainda mais para as mulheres, determinando variações salariais para o mesmo cargo. Exercendo funções afins, uma profissional negra chega a ganhar metade do salário de um profissional negro. Segundo Sergei Dilon Soares, pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), à medida que os negros são promovidos em seus locais de trabalho, tanto maior será a discriminação. Tratando-se de questão racial, o mercado de trabalho reflete o imaginário popular.

Ocorre que no imaginário existem equívocos e preconceitos que se estendem pela sociedade, mas não se justificam. Uma pesquisa do Cebepej (Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais) revela uma dessas imprecisões generalizadas. Em São Paulo, segundo o levantamento, a maioria dos crimes contra o patrimônio (furtos e roubos) é cometida por brancos, e não por negros, como pensa o senso-comum. Não há, portanto, argumento estatístico para fundamentar que são os negros os principais responsáveis por ações criminosas e violentas. Outros estudos contrariam ainda mais o senso-comum, ao demonstrarem que um dos alvos mais visados dos referidos delitos é justamente a população negra.

Em que se baseia, então, a idéia de que o negro é mais propenso à criminalidade? O que há por trás da suposta democracia racial brasileira? A resposta para essas perguntas pode ser resumida numa só palavra: racismo. A tese de igualdade racial no Brasil é um embuste histórico, e nem mesmo as normas e os princípios da Constituição nacional a sustentam.

O racismo à brasileira é de tal modo sutil, que o País procura se apresentar como exemplo de confraternização racial - falsa imagem que camufla os limites que os negros enfrentam na sociedade, no mercado de trabalho, nos centros educacionais, na política e em todas as esferas em que possam aspirar à inserção. É desagradável, embora necessário, ter de constatar esta realidade tão adversa a propósito do Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial. Se pouco mudou desde o Massacre de Sharpeville, ao menos se fortaleceu o sonho de um futuro melhor para todos.

Nosso mandato, uma das poucas representações da população negra na política nacional, saúda as pessoas que também lutam por um mundo onde não haja manifestações discriminatórias. Persistir nessa luta é o caminho para o triunfo da igualdade.

Nivaldo Santana, deputado estadual do PCdoB , presidente da Comissão de Relações do Trabalho da Assembléia Legislativa de São Paulo

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