Opinião - Black-out e Rodoanel


03/12/2009 17:37

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Incrível o desenrolar dos fatos: enquanto a ministra Dilma é lançada ao fogo por causa do black-out, o governador tucano José Serra acabou sendo generosamente poupado de responsabilidade pelo desabamento do Rodoanel.

Com Dilma, áspero tom político e desqualificação. Serra, inocentado de tudo, fez-se vistas grossas ao óbvio e aceitou-se a desculpa que deu: "Uma barbeiragem!". O viaduto caiu sem precisar de vento ou tempestade. Lamentável o tom leviano em se tratando da maior obra viária do país. Afinal, podemos confiar que a obra é segura?

Auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) constatou que as empreiteiras responsáveis usaram vigas pré-moldadas para baratear custos. Mais: alteraram métodos construtivos, com redução no número de vigas nas pontes, substituição de estacas metálicas por pré-moldadas e troca de areia por brita em muros de contenção.

Usou-se menos material de construção, mas o dinheiro pago foi o mesmo. O trecho Sul, onde ocorreu o acidente, está orçado em R$ 3,6 bilhões, dos quais R$ 1,2 bilhão foi repassado ao Estado pela União.

Obra mais destacada na farta e generosa propaganda do governo José Serra, o Rodoanel é, também, um dos maiores alvos de suspeitas e de denúncias. Para o TCU e o Ministério Público, o Rodoanel é como um gigantesco ninho de superfaturamento e irregularidades de todo o tipo.

O TCU listou 79 irregularidades "graves" em relatório recém-divulgado, 13 delas no trecho Sul, onde houve o desmoronamento. Desde o ano passado, o TCU avalia a suspensão do repasse de verbas, por causa de pagamentos acima do valor previsto, contratação de serviços sem licitação, abertura de licitação sem licença ambiental e sobrepreço. O desdobramento pode gerar anulação do contrato e ressarcimento de valores.

O governo do Estado, por meio da Dersa, é o responsável pela fiscalização da obra. A Dersa, por sua vez, repassou a tarefa a cinco empresas, contratadas pela vultosa quantia de R$ 24,5 milhões. Mesmo assim, foi o que se viu: despencaram três vigas, de 85 toneladas, sobre a Rodovia Régis Bittencourt, esmagando três carros e ferindo três pessoas. Jamais o Poder Público pode abrir mão do seu papel fiscalizador!

A queda foi o terceiro desastre ocorrido, nos últimos três anos, em grandes obras de engenharia executadas pelo governo do Estado. Em 2007, sete pessoas morreram quando se abriu uma cratera na obras do metrô - Linha 4. Em 2008, desabou trecho do viaduto em construção do Expresso Tiradentes, antigo fura-fila. Mera coinciência? Mais barberagens?

Sobre as relações da Dersa com as construtoras do Rodoanel recaem as suspeitas e as denúncias já apresentadas pelo TCU e o Ministério Público. Dessas relações já resultou, por exemplo, a assinatura de aditivos de R$ 265 milhões aos contratos originais.

A Bancada do PT na Assembleia Legislativa não se conforma e representou ao Ministério Público Estadual e ao Federal, para apurar custos e prazos. O partido pede, ainda, a suspensão das obras até que sejam apurados os motivos do acidente.

As preocupações de Serra são diferentes. De olho no calendário eleitoral, o governador afirmou que a obra seria retomada em 15 dias, sem esperar a conclusão da perícia pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas.

É no mínimo leviandade o calendário eleitoral ditar o cronograma de obras do porte do Rodoanel, do Metrô e das Marginais. O PT não abre mão de rigorosa apuração dos fatos.



*Maria Lúcia Prandi é educadora, deputada estadual, cientista política. Colaboradora.

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