Perdidos entre as páginas dos jornais de fevereiro de 1922, pequenos "reclames" anunciavam o Festival de Arte Moderna, abrihantado pela participação de Guiomar Novais e Heitor Villa-Lobos. Mas quem se dispôs a desembolsar os 186 mil réis que davam direito às três récitas levou um susto. Ao transpor os degraus de acesso ao Teatro Municipal, os cavalheiros de fraque e cartola, acompanhados de damas elegantemente vestidas, paravam estarrecidos.E não era para menos: convertido em museu improvisado, o suntuoso hall apresentava pinturas e esculturas que, com raras exceções, desdenhavam de todos os cânones artísticos ensinados nas melhores academias daqui e de além mar.E pouco adiantava buscar coerência ou rima nos versos declamados no palco. Ali, uma enxurrada de desatinos literários feria sensibilidades refratárias a experimentalismos lingüísticos. Delírios poéticos sobre aeroplanos, sombrinhas e capas de chuva, sapos e guerra provocavam os espectadores, que revidaram numa bem orquestrada vaia regida pelos estudantes do alto das galerias.Uma profusão de estudos, ensaios e hipóteses surgiu desde então para tentar explicar o fenômeno iniciado naquela Semana de 22. Considerada uma fronteira definitiva no panorama artístico e literário do país, a Semana de Arte Moderna e seus principais artífices, em especial Mário de Andrade, ocupam um lugar privilegiado na historiografia contemporânea. Assim , ao completar o movimento 81 anos, o Diário Oficial do Poder Legislativo presta sua homenagem aos vanguardistas, publicando algumas das obras (versos e pinturas) daqueles que, com raro talento e criatividade, colocaram o Brasil em pé de igualdade com o que de mais moderno acontecia na arte européia e de todo o mundo ocidental, criando e mantendo viva e pulsante uma nova maneira de expressão cultural da brasilidade. PREFÁCIO INTERESSANTÍSSIMOLeitor:Está fundado o Desvairismo.Este prefácio, apesar de interessante, inútil.Alguns dados. Nem todos. Sem conclusões. Paraquem me aceita são inúteis ambos. Os curiososterão prazer em descobrir minhas conclusões,confrontando obras e dados. Para quem merejeita trabalho perdido explicar o que, antesde ler, já não aceitou.Quando sinto a impulsão lírica escrevo sempensar tudo que meu inconsciente me grita.Penso depois: não só para corrigir, como parajustificar o que escrevi. Daí a razão deste prefácio interessantíssimo.Aliás muito difícil nesta prosa saber ondetermina a blague, onde principia a seriedade.Nem eu sei.E desculpe-me por estar tão atrasado dosmovimentos artísticos atuais. Sou passadista,confesso. Ninguém pode se libertar duma só vezde teorias-avós que bebeu; e o autor destelivro seria hipócrita si pretendesse representarorientação moderna que ainda não compreendebem.( Mário de Andrade, Prefácio Interessantíssimo -- trecho)Fontes: Semana de 22, entre vaias e aplausos - Márcia Camargos (Boitempo Editorial); Poesias Completas de Mário de Andrade (Círculo do Livro); Site www.asemanade22.hpg.ig.com.br