Resistir à Alca, um ousado projeto de anexação - OPINIÃO

Jamil Murad*
18/06/2002 18:20

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Imagine duas comunidades vizinhas, uma rica e poderosa e a outra pobre mas com grande capacidade para gerar riqueza. A pobre pode, com determinação e trabalho, desenvolver-se a partir de suas próprias forças ou ser explorada pela rica, que irá aproveitar o seu potencial e acumular ainda mais riqueza.

São essas duas possibilidades que estão em jogo no Brasil hoje. Seguir um caminho de desenvolvimento nacional com soberania, buscando a integração entre os países da América Latina, ou seguir um caminho de subordinação econômica aos Estados Unidos aderindo ao acordo da Área de Livre Comércio das Américas - ALCA.

A ALCA é o mais ousado projeto de anexação política, econômica, social e cultural já idealizado. Seu objetivo é manter a hegemonia norte-americana. Suas conseqüências para o nosso país serão desastrosas: dentre elas, o desemprego e a flexibilização dos direitos dos trabalhadores. A abertura indiscriminada da economia brasileira transformará o país numa imensa zona franca voltada para a exploração de mão-de-obra barata pelos norte-americanos.

As negociações lideradas pelos Estados Unidos entre os 34 países da América do Norte, Central, do Sul e o Caribe (com exceção de Cuba), são sigilosas. Não há transparência em torno dos pontos negociados e poucas informações são divulgadas. Mas, o pouco a que se tem acesso já demonstra o teor perverso das regras do novo bloco econômico, que trarão vantagens extraordinárias para os Estados Unidos e perdas irremediáveis para as outras nações.

Indústrias e empresas norte-americanas terão livre acesso aos mercados vizinhos, ao mesmo tempo em que os Estados Unidos fecham suas fronteiras para preservar sua economia. Essa abertura unilateral dos mercados, substituindo a produção nacional por bens importados, e o fim dos instrumentos de proteção tarifária, pode levar ao fechamento de inúmeras empresas nacionais e, com isso, eliminar milhares de postos de trabalho. As empresas estadunidenses poderão explorar também o mercado de serviços dos outros países, o que pode trazer mudanças profundas em áreas como saúde, educação, habitação e meio-ambiente.

O discurso do ?livre comércio? cai por água abaixo quando analisamos o desempenho econômico dos países que fariam parte da ALCA. Não pode existir igualdade de condições comerciais, entre economias tão díspares, sem que haja instrumentos de proteção para os menos favorecidos. A ALCA prevê exatamente o inverso. Se existe proteção comercial nas cláusulas do acordo, elas beneficiam os Estados Unidos que detêm 75% da riqueza do continente.

O governo Fernando Henrique Cardoso já abriu os caminhos para facilitar a entrada do Brasil na ALCA. As investidas contra os direitos trabalhistas (alteração do Art. 7o. da Constituição, mudanças na CLT, entre outras) são apenas o início da escalada no sentido da flexibilização e da informalidade. A aparente estabilização econômica foi feita com base na recessão e no desemprego e teve como conseqüência a perda do poder aquisitivo dos trabalhadores, conforme resultado divulgado pelo último censo do IBGE.

Além do objetivo estratégico de consolidar um bloco continental de domínio praticamente absoluto dos Estados Unidos, a ALCA visa impedir a possibilidade da unificação latino-americana ou sul-americana, que poderia representar um entrave aos interesses internacionais dos Estados Unidos na briga pela liderança comercial no mundo.

Essas são algumas das razões que tornam a campanha contra a ALCA uma luta estratégica para o povo brasileiro. As eleições são um momento privilegiado para ampliar esse debate com a população. Devemos desmascarar aqueles que, no Brasil, são defensores da subordinação nacional à política imperialista norte-americana. No momento em que se discute um novo rumo para o país e a necessidade de romper com a política neoliberal, alçar bem alto a bandeira contra a ALCA é imprescindível para garantir a vitória de um projeto comprometido com a democracia, a justiça social e a soberania nacional.

*Jamil Murad é médico, pós-graduado em nefrologia, funcionário do Hospital do Servidor Público e do IAMSPE e deputado estadual pelo PC do B

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