Human Rights Watch apresenta relatório sobre centros de educação juvenil na Assembléia

Representante da entidade americana, o deputado Renato Simões e seus assessores falam sobre a dura realidade dos centros de convivência juvenil no país.
10/04/2003 21:14

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DA REDAÇÃO

"No Norte do Brasil é muito comum o espancamento de crianças pela polícia e sua detenção em centros de reabilitação sem condições de garantir seus direitos humanos básicos. Depois de admitidas nesses centros, as crianças continuam sujeitas à violência, desta vez por parte de outros jovens internados. É freqüente as crianças ficarem confinadas em suas celas por períodos muito longos, com possíveis graves conseqüências ao bem-estar emocional. Muitos jovens detidos não recebem qualquer tipo de educação e não se lhes oferecem oportunidades de desenvolver as habilidades de que necessitarão para ter uma vida satisfatória e produtiva como adultos. As meninas, normalmente não dispõem de atendimento básico de saúde e têm menos oportunidades que os meninos para fazer exercícios físicos, recrear-se e ter outras atividades. O confinamento em tais condições é uma violação das leis internacionais e do Estatudo da Criança e do Adolescente do Brasil."

Esse é o início do relatório que a Human Rights Watch - entidade americana que investiga e divulga casos de violação dos direitos humanos em todo o mundo - apresentou nesta quinta-feira, 10/4, na Assembléia Legislativa. Para divulgar as dificuldades de 17 unidades de recuperação juvenil em cinco estados brasileiros (Amapá, Amazonas, Pará Rondônia e Maranhão) o deputado Renato Simões (PT), convocou a imprensa para uma coletiva, que contou com a presença de representantes de várias ONGs.

De acordo com Michael Bochenek, responsável pelo documento, este é o 16º relatório da entidade sobre a justiça juvenil em todo o mundo. Além do Brasil, a Human Right Watch investigou a situação de entidades juvenis na Guatemala, Jamaica, Bulgária, Egito, Índia, Pasquitão, Turquia, Irlanda do Norte e quatro estados americanos. "Os relatórios foram bem aceitos pelos governos desses países". Segundo ele, apesar das diferenças econômica e cultural entre os países visitados pelo organismo, os problemas relacionados à recuperação do adolescente infrator são semelhantes. "Nos EUA, por exemplo, o governo adota medidas de repressão nos Estados que não são adequadas à legislação internacional de atendimento aos jovens", explicou Bochenek.

Realidade nacional

"Apesar de a pesquisa ter sido realizada em centros de recuperação de Estados do Norte do país, não existem diferenças entre as unidades de reabilitação juvenil no sul e sudeste. Basicamente, a principal diferença entre as entidades juvenis está no número de internos", declarou o advogado de Direitos da Criança Michael Bochenek.

De acordo com o deputado Renato Simões, que na última legislatura presidiu a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia, em São Paulo existem cerca de cinco mil internos, "distribuídos em centros de recuperação sem condições de reabilitação". Para Simões, as constantes alterações do sistema que rege a Febem mostra a fragilidade das autoridades competentes em recuperar os menores infratores. "Atualmente, os funcionários da Febem são prestadores de serviços sem nenhum tipo de preparação para tratar dos adolescentes.

Podemos verificar que condições básicas de sobrevivência, como educação, saúde, sistema de reclamação, condições especiais para as meninas internas - consultas ginecológicas e pré-natal para as grávidas - e a prática de atividade física não existem na Febem, principalmente na unidade Franco da Rocha." A falta de preparo dos monitores também funciona como estopim para o início das rebeliões.

O ECA

O relatório da Human Rights parabeniza o texto do Estatuto da Criança e do Adolescente, ECA, "uma das melhores legislações para adolescentes do mundo. Tem quase todos os componentes das leis internacionais", disse o advogado da entidade. Mas, apesar de sua eficiência legislativa, o ECA ainda falha na prática. Com mais de dez anos de existência, o estatuto é desrespeitado pela maioria dos organismos envolvidos na apreensão dos menores infratores, principalmente pela polícia que, além de desconhecer o texto, espanca os menores antes e depois da prisão. "Esses abusos ocorrem freqüentemente nas delegacias, uma vez que a lei brasileira permite a prisão de crianças e adolescentes por até cinco dias enquanto esperam sua transferência para uma unidade de detenção juvenil", diz o relatório.

Bochenek pode constatar irregularidades desse sentido no Centro de Internação Espaço Recomeço, no Pará, onde, dois dias após uma rebelião, os adolescentes relataram abuso de autoridade da tropa de choque.

Internações

De acordo com Ariel de Castro, um dos assessores de Renato Simões, o atual governo de São Paulo usa o alto índice de apreensões para dizer que o Estado está mais seguro. "Mas isso não significa que a violência, tanto na Capital quanto no Interior, diminuiu." Na sua opinião, a estrutura da Febem "fomenta" a profissionalização do crime. "O governador deveria utilizar critérios de separação para não permitir que menores detidos pela primeira vez fiquem em contato com os de alta periculosidade", justificou Castro.

O relatório da Human Rights Watch será entregue nesta sexta-feira, 11/4, ao governo federal.

alesp