CAFÉ REQUENTADO - OPINIÃO

Milton Flávio*
30/08/2001 17:47

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De tempos em tempos, ora por conta de um fato novo qualquer, ora por conta dos resultados de uma pesquisa, a discussão ressurge, com ares de novidade, mas tão requentada quanto café de ontem: afinal, hoje, a corrupção é maior ou menor que a verificada no passado? O último levantamento disponível - o da CNT-Sensus -, divulgado no final de agosto, mostra que para 35% dos entrevistados a corrupção na vida pública "sempre foi assim e tudo vai continuar na mesma". Outros 29% acreditam que a situação está pior. Contingente parecido de pessoas (28,7%) está convencido de que "as coisas estão melhorando". Entre um palpite aqui e outro acolá, fica-se com a impressão de que nunca se roubou tanto.

Aquela é uma questão difícil de ser respondida, ao menos de forma objetiva, com números. Afinal, o balanço da corrupção não é algo que se publique nos jornais, para que acionistas e curiosos em geral tenham acesso às informações. Agora, parece inquestionável o fato de que, num regime fechado, com imprensa sob censura, os negócios escusos tendem a proliferar. Um dia desses, um telespectador enviou e-mail a um programa de TV perguntando aos debatedores se eles tinham condições de enumerar alguns escândalos do regime militar. De pronto, o caçula da mesa - "uma criança na época da ditadura", segundo ele próprio - passou a citar uma série de ocorrências. Ressalte-se que os fatos por ele citados se tornaram públicos numa época em que os jornais eram forçados a substituir reportagens por receitas de Dona Benta e versos de Camões. O que não contribuiu nem para o controle da obesidade, nem para tornar a população brasileira mais erudita.

Vale lembrar que boa parte dos crimes que hoje estão sendo divulgados foi praticada no passado. É o caso, por exemplo, dos desvios do Banpará e da provável remessa de dinheiro por parte de Paulo Maluf para paraísos fiscais. Durante quase dois anos, presidi na Assembléia Legislativa a CPI das indenizações ambientais, que apurou uma série de crimes cometidos contra o Estado. É sintomático que a grande maioria tenha sido cometida na década de 80.

Não se pretende negar, por óbvio, que existe corrupção. O que precisa ser feito é a distinção entre a corrupção difusa e o crime organizado. Sempre haverá fiscais empenhados em achacar comerciantes. E a quantidade de fiscais corruptos vai variar de acordo com a disposição de comerciantes em suborná-los ou não. Sempre haverá parlamentares que ingressam na vida pública para enriquecer a partir de negócios escusos. Sua vida, porém, será dificultada se o Parlamento criar mecanismos mais adequados de punição e os eleitores lhes negarem o voto nas eleições seguintes. O crime organizado é outra coisa. No caso público, trata-se de gente que, no poder, forma uma rede toda voltada para o roubo do dinheiro dos contribuintes. Nesse sentido, evoluímos. Hoje, é grande a fiscalização da imprensa e do Ministério Público. Vários procedimentos legais foram criados para dificultar a ação de quadrilhas. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) é apenas um desses instrumentos.

O que se pretende dizer é que, ao contrário do que todas as pessoas de bem gostariam, infelizmente, a corrupção não é algo que se elimina de uma hora para outra, com uma simples canetada ou com tropas nas ruas. Seu combate implica eterna cobrança e vigilância da sociedade, bem como aperfeiçoamento das leis e do Poder Judiciário. Dá trabalho, sim. Mas não há outro jeito.

Milton Flávio é deputado estadual pelo PSDB e presidente da Comissão de Assuntos Internacionais da Assembléia Legislativa.

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