O Risco do "Paradão"

OPINIÃO - Arnaldo Jardim*
08/05/2003 18:40

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Aumento da produção de grãos, incremento do mercado para o açúcar, competitividade de setores de nossa indústria. Tudo isto, que são boas notícias, pode sofrer uma grande trombada: o "Paradão"!

Há um gargalo em nossos portos de exportação e na nossa malha ferroviária. E os investimentos nos últimos anos foram pífios.

Independente do governo, a necessidade de ampliar o superávit da balança comercial brasileira é uma constante. E não é de hoje - nos anos 70, o próprio governo militar divulgou o lema "exportar é o que importa". Muitas coisas mudaram em 30 anos: a economia brasileira passou por mudanças profundas, superando a hiperinflação dos anos 80, ganhando produtividade e abandonando a mentalidade que lucrava com a especulação com a terra, que agora vale pelo que produz. No entanto, um setor que parece ter ficado nos anos 70 é justamente o do transporte, fundamental para o escoamento de bens tanto no mercado interno como no externo.

As vantagens competitivas obtidas com grande sacrifício pelo setor produtivo brasileiro, espicaçado por juros altos, muitas vezes caem no buraco da incompetência e da inconseqüência por que passa a infra-estrutura no País. Buraco mesmo. O meio de transporte privilegiado em meados do século XX foi o mais caro, o rodoviário. Isso num país que, em grande parte, conta com terrenos favoráveis à instalação de ferrovia - este sim, um dos meios mais baratos do mundo, ao lado da navegação. Segundo estudo da UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro, mais de 60% dos bens são transportados pelo Brasil por rodovias, em comparação com 26% nos Estados Unidos e 8% na China.

Este absurdo, no entanto, ganha ares de desastre quando se analisa o estado das rodovias brasileiras - lastimável, para dizer o mínimo. Tal fato é reconhecido pela própria Confederação Nacional de Trânsito (CNT), cuja condição das estradas foi considerada ruim, péssima ou deficiente em 78% dos casos. De acordo com a UFRJ, a conta desse descaso com a logística está na faixa de R$ 110 bilhões ao ano, diante dos atrasos constantes na entrega de mercadorias.

As hidrovias, que poderiam representar um ponto favorável ao desenvolvimento econômico do País, também são relegadas a um segundo plano - só se tornam importantes quando usadas para escapar do pedágio. E, no entanto, representam um caminho natural para as exportações brasileiras.

O transporte rodoviário continua a ter primazia no Brasil, recebendo investimentos de R$ 8 bilhões entre 1995 e 2000, em comparação com os R$ 500 milhões para as ferrovias e os R$ 200 milhões para as hidrovias. Para completar este quadro perturbador, é preciso levar em conta, ainda, o aumento no roubo de cargas, que saltou de 3 mil casos em 1994 para 8 mil em 2001. Apesar dos recursos, as rodovias continuam esburacadas e perigosas.

O aumento da produtividade das operações portuárias, ocorrido nos últimos anos, não é suficiente para contornar os problemas que se avizinham a passos largos. O avanço da colheita da soja e da cana promete trazer imagens de longas filas de caminhões parados com grão, farelo, óleo e açúcar no caminho dos portos brasileiros, principalmente no Paraná.

Esse atestado de falta de planejamento torna-se mais descabido quando se observa os recursos programados para a conservação das rodovias existem. Este seria o papel dos valores arrecadados pela Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), que seriam encaminhados ao Fundo Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (FNIT). No entanto, o fundo, criado no ano passado, não saiu do papel devido ao veto do então presidente Fernando Henrique Cardoso.

Exigir que o FMI considere estes investimentos como tal - e não como despesa - para não penalizar a nossa busca por superávit primário, recuperar a capacidade de investir do Estado Brasileiro, estabelecer vinculações orçamentárias, utilizar a capacidade de crédito do BNDES e ter um plano estratégico de logística é urgente e inadiável!

A esperança é que, assim, esse quadro se reverta e a infra-estrutura transforme-se em um fator de desenvolvimento das exportações brasileiras - e não mais seu calcanhar-de-aquiles.



* Arnaldo Jardim é deputado estadual, engenheiro civil, foi secretário da Habitação, em 1993, e Conselheiro Consultivo da Artesp -Agência Reguladora dos Transportes de SP

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