Técnicos e assentados discutem propriedade dos assentamentos e alterações na legislação fundiária


07/06/2006 20:57

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Deputada Beth Sahão (1ª dir.) preside os trabalhos da comissão<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/ComAgri7junB.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Assentados e técnicos em política fundiária <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/ComAgri7junA.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

A Comissão de Agricultura e Pecuária realizou nesta terça-feira, 7/6, reunião com assentados e técnicos em política fundiária para discutir possíveis alterações na Lei 4.957/85, que regulamenta a permissão de uso de terras de assentamentos, mantendo os assentados como permissionários da Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp).

Segundo o diretor-executivo da entidade, Jonas Villas Bôas, o anseio dos assentados mais antigos é possuir o título de propriedade dos lotes ou outro documento que lhes dê segurança jurídica, além de facilitar o crédito junto a instituições bancárias. "Temos também de discutir se o Itesp deve ainda continuar prestando assistência técnica a assentamentos antigos ou se deve concentrar seus esforços nos projetos novos."

Villas Bôas também comentou a necessidade de se criar instrumentos de financiamento para a aquisição das benfeitorias acessórias aos lotes, pois muitas vezes os primeiros posicionados na lista para a reforma agrária não têm condições de arcar com o seu custo. "É uma legislação antiga, que precisa ser atualizada", afirmou o diretor-executivo, sem deixar de frisar a superioridade do modelo fundiário paulista em relação ao federal. "Nos assentamentos novos temos 6% de desistência, nos antigos, com mais de 20 anos, chega a 12%, o que é pouco se comparado aos 40% de abandono de programas realizados no resto do país."

Direito de superfície

O procurador do Estado Juvenal Boller foi um dos idealizadores da Lei 4.957/85, tendo atuado com o engenheiro agrônomo José Gomes da Silva quando este foi secretário da Agricultura de São Paulo, durante o governo de Franco Montoro (1982/85). Depois de realizar uma breve retrospectiva do desenvolvimento das políticas agrárias adotadas no país, desde o Plano de Revisão Agrária do Estado de São Paulo (1959 a 63) e a elaboração do Estatuto da Terra, promulgado em plena ditadura militar, Boller alertou os assentados presentes à reunião para que não se iludam com a possibilidade de obter o título de propriedade. "O Estado estaria, neste caso, violando o princípio da impessoalidade que deve ser guardado pela administração pública."

Segundo o procurador, haveria duas soluções juridicamente possíveis para os assentados. Uma delas seria a aquisição da propriedade dos lotes por preços próximos aos de mercado, mediante um financiamento. A outra possibilidade seria a obtenção não da propriedade, mas do direito de superfície, ou seja, o direito de uso da terra por períodos de 20 anos, indefinidamente renováveis. "Nesse caso, o direito é hereditário e pode ser registrado em cartório. Só não há a possibilidade de venda dos lotes."

Reconcentração fundiária

Falando pela Associação Brasileira da Reforma Agrária (Abra), José Juliano alertou que a questão não pode ser discutida somente pelo ponto de vista dos assentados, para quem, isoladamente, a propriedade da terra seria a melhor alternativa. "Precisamos evitar a reconcentração fundiária", explicou.

Já para Sônia Moraes, também da Abra, a transferência da propriedade da terra sempre foi evitada para obstar o favorecimento aos "amigos do rei". Além disso, Sônia afirmou acreditar que os assentados não precisam da propriedade de seus lotes para dar como garantia de empréstimos bancários. "O que falta é apoio agrícola. Precisamos exigir do governo estadual uma política de apoio à agricultura familiar que gere postos de trabalho e renda."

Entre os representantes dos assentados, Adélia Oliveira de Farias, da Organização de Mulheres Assentadas e Quilombolas do Estado de São Paulo, comentou como foram boas as ações públicas no tempo em que os governos federal e estadual tinham representantes de um mesmo partido. "Hoje, somos reféns de um jogo político entre o Itesp e o Incra", lamentou. Quanto à possibilidade de venda dos lotes, Adélia considerou que seria justo em alguns casos, como, por exemplo, o de uma senhora que ficou viúva. "Seria certo ela ir embora sem nada?", questionou.

Pedro Xapuri, de um assentamento próximo a Franca, mostrou-se contrário à possibilidade de venda das terras por parte dos assentados que desistam da produção. "O valor da terra é o que ela produz. O resto é especulação." Para ele, o agricultor que vende a sua propriedade e vai para a cidade tende a se tornar mais um desempregado ou subempregado. "Nem as usinas de cana estão recrutando cortadores com mais de 40 anos!", alertou.

Comercialização

Mauro Bragato (PSDB) considerou que sempre haverá uma grande preocupação em impedir a comercialização de lotes que foram adquiridos com dinheiro público. "O que os assentados estão buscando é segurança jurídica. É poder recorrer a um banco com mais facilidade, se for necessário." Para Bragato, os esforços do Estado e da União devem ser coordenados e se concentrar na criação de meios que facilitem a comercialização da produção da agricultura familiar, dificuldade encontrada tanto pelos assentados dos projetos de reforma agrária como pelos pequenos proprietários rurais.

A presidente da Comissão de Agricultura e Pecuária, deputada Beth Sahão (PT), advertiu que a reunião apenas iniciou o processo de discussão de uma possível atualização da Lei 4.957/85, e sugeriu aos participantes a realização de novas reuniões, com temas bem específicos, apesar da dificuldade para a tramitação de qualquer propositura durante o período eleitoral, que começa em 6/7.

alesp