No meu tempo era assim


06/02/2012 18:00

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Qualquer pessoa que passou dos quarenta anos sabe disso. Como quem está bem acima dessa idade, sou obrigado a começar o texto falando que, no meu tempo, todos nós, adolescentes, começávamos a trabalhar aos doze, treze anos de idade.

Tudo era diferente, e não é difícil mostrarmos isso. As férias eram usadas para descanso, cinemas para alguns, brincadeiras das ruas para todos, futebol, soltar papagaios que hoje mudaram de nome e de função; viraram instrumentos de competição, onde o cerol, apesar de proibido, virou arma e responsável por acidentes sérios.

Os nossos heróis eram menos poderosos que os atuais, criados e mantidos por multinacionais do entretenimento. Curtíamos a infância, mesmo sabendo que aos doze anos teríamos a "carteira de menor", que abria as oportunidades no mercado de trabalho.

Aos dezoito anos, era uma luta para se fugir do Serviço Militar obrigatório. Hoje, milhares de jovens se apresentam, dispostos a servir nas Forças Armadas, e encontrar ali a oportunidade de emprego. E são dispensados.

Como se vê, tudo mudou. Com a criação do ECA- Estatuto da Criança e do Adolescente, o jovem fica impedido de trabalhar, e isso virou justificativa para a nossa realidade. O jovem pratica delitos, e é protegido. O jovem não trabalha, e culpa-se o ECA. O Poder Público finge que protege, o jovem finge que é protegido, a família finge que está tudo bem, e cresce a bolha da mentira.

No mercado de trabalho não é novidade para ninguém que, após os quarenta anos, muitos trabalhadores são banidos, considerados velhos. Ou se adaptam aos novos métodos, fazem cursos de reciclagem profissional, ou caem no desemprego. E, como muita gente nessa idade está há muito tempo longe dos bancos escolares, a situação fica ainda mais complicada.

Por outro lado também sabemos que, se todos os jovens - ora protegidos pelo ECA - pleiteassem uma vaga no mercado de trabalho, reduziriam ainda mais as oportunidades para o pessoal acima dos quarenta anos, e agravaria ainda mais a situação.

Não bastassem a falta de oportunidades e a falta de pessoal técnico devidamente especializado, ainda enfrentamos a competição de produtos chineses, muitos deles fabricados em regime de quase escravidão. Produtos muitas vezes considerados descartáveis, que chegam a preços irrisórios, agravando um quadro que nos coloca em uma única posição, a de um país prestes a sofrer contínuas derrotas no mercado internacional.

Apesar desse quadro, vamos sendo iludidos, ou seja, fala-se uma coisa, e pratica-se outra. Justifica-se o fato do jovem não poder trabalhar, culpando-se o ECA. Mas, na verdade, o que sabemos é que não dispomos de vagas para esses jovens, e, de falácia em falácia, vamos nos enganando, ou nos deixando enganar.

*Vitor Sapienza é deputado estadual (PPS), presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia e Informação, ex-presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, economista e agente fiscal de rendas aposentado

"Na verdade, sabemos é que não dispomos de vagas para esses jovens no mercado de trabalho"

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