A tragédia de dois jovens no Interior

Opinião
17/11/2005 16:34

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O feriado de 15 de Novembro, Dia da Proclamação da República, teve duas notícias de tragédias envolvendo jovens no Interior do Estado de São Paulo. Em Pedregulho, cidade da região de Franca, um garoto de 14 anos matou seu irmão de criação de quatro anos. Em Araraquara, um ex-interno da Febem de 20 anos, tido como verdadeiro exemplo de recuperação, morreu na cadeia em que havia ficado detido por 80 dias, acusado de latrocínio. Essas tragédias devem ser lamentadas e servem para uma reflexão sobre jovens e o mundo do crime.

Cleonder Santos Evangelista não era qualquer ex-menor infrator: ele estava casado, havia recebido uma bolsa para estudar Direito e parecia ter uma vida normal. Ao escrever um livro sobre sua experiência na Febem e a luta para abandonar o mundo do crime, ele tirou fotos ao lado do governador Geraldo Alckmin e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas algo estava errado: em abril, Cleonder foi preso na cidade de Borborema, acusado de matar e roubar. Seu pai, Francisco Antunes Evangelista, garante que ele era inocente. O fato é que o jovem ficou detido nos últimos meses no Centro de Detenção Provisória de Araraquara, onde acabou morrendo. O atestado de óbito relata as causas: insuficiência respiratória e pneumonia. A família promete processar o Estado.

Já em Pedregulho, a polícia mantém em sigilo o nome do garoto de 14 anos que provocou a morte de seu irmão de criação, de quatro anos, por afogamento, numa lagoa, alegando que era ofendido pela criança. A tragédia abalou a cidade.

Crimes envolvendo crianças e adolescentes esbarram em polêmica, pois, para algumas pessoas, os assassinos de menos de 18 anos são verdadeiras vítimas. Não sou a favor do excesso de tolerância com quem mata, seja qual for o motivo. Minha experiência de 40 anos de trabalho como jornalista e radialista acostumado a lidar com questões de violência e minha atuação de 19 anos como deputado estadual, garantem posição firme.

Tenho o hábito de fazer comparações entre as leis do Brasil e as dos países desenvolvidos. Assim, insisto na necessidade de se reduzir a maioridade penal, atualmente de 18 anos. Adolescentes que matam precisam ir para a cadeia e cumprir pena, sem qualquer benefício. É assim nos Estados Unidos e em vários países europeus.

No caso do ex-interno da Febem, todos devemos lamentar sua morte. Uma vez que Cleonder Santos Evangelista ainda não havia sido julgado pela Justiça pelo crime de latrocínio, é possível acreditar tanto nos acusadores quanto nos familiares que o consideravam inocente. Cabe à Justiça investigar todos os detalhes, para saber até que ponto a cadeia de Araraquara abrigava um inocente que acabou morrendo em suas instalações. Só assim será possível verificar se a propalada recuperação do ex-interno da Febem, apresentada em livro, era verdadeira ou simples enganação.

De qualquer modo, fica no ar a dúvida: será que todos os antigos menores infratores que juram ter mudado de vida voltam ao mundo do crime?

No Brasil, se um jovem de 17 anos pode ser jogador de futebol e ganhar mais de R$ 100 mil reais por mês, pode ser músico e pode até casar e ter filhos, por que não pode ir para a cadeia quando comete um crime?

O Código Penal, com base na Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e outras leis, estabelecem uma série de proteções aos jovens. Até aos jovens assassinos. A mesma legislação que trata crianças desamparadas pelo destino acaba sendo extremamente falha ao não admitir que inúmeros crimes, entre os quais homicídios, são cometidos por menores de idade, pessoas habilitadas para determinados direitos, mas imunes aos castigos previstos para quem fere a lei.

A maioridade penal não deveria ocorrer aos 18 anos. Sem dúvida, é hora de mudar. E o País perdeu uma preciosa oportunidade, neste ano, ao deixar de ampliar o referendo de 23 de outubro, foi só sobre o comércio de armas. Também poderia ter sido votada essa questão, de grande alcance social.

Nas regiões de São Paulo, Campinas, Santos, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, São José dos Campos, Bauru, Marília, Araçatuba, são numerosas as quadrilhas com pelo menos um ou dois marginais de menos de 18 anos. E quase sempre os menores assumem a autoria de delitos, para livrar os comparsas maiores de punição. Tudo porque, na pior das hipóteses, como infratores ficarão, no máximo, apenas três anos longe das ruas. É pouco e vergonhoso. Isso precisa mudar.

*Afanasio Jazadji é radialista, advogado e Deputado Estadual pelo PFL.

alesp