DIA DA CRIANÇA E TRABALHO INFANTIL - OPINIÃO

Jilmar Tatto
11/10/2000 17:50

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Na semana em que comemoramos o Dia da Criança, cuja ênfase da data se resume ao estímulo consumista, merece destaque o tema trabalho infantil. No Brasil, cerca de 3,8 milhões de crianças de 5 a 14 anos têm mão-de-obra explorada. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 16,9% de toda a população na faixa etária entre 10 e 14 anos estão trabalhando, sendo 60% na área rural e 40% no setor urbano. Em geral, trabalham em atividades penosas, perigosas e insalubres, expostas a uma série de riscos químicos, físicos e biológicos. Em conseqüência, passam a apresentar forte déficit de crescimento e, no futuro, serão adultos doentes; isto quando não morrem precocemente.

Em culturas como as de cana-de-açúcar, fumo e laranja, as crianças brasileiras expõem sua saúde a riscos, como doenças respiratórias, transtornos neurológicos e anomalias do sistema imunológico, além de lesões por uso de ferramentas de corte ou decorrentes de posturas inadequadas. A atividade sisaleira também causa problemas nos aparelhos respiratório e auditivo.

Fenômeno que tem como causa principal a miséria, ocasionada por taxas extremamente elevadas de desemprego e subemprego de adultos, tanto nas zonas rurais quanto nas urbanas, o trabalho infantil é adotado como alternativa para garantir a sobrevivência de famílias carentes. Situação que se explica, sobretudo, por conta da injusta distribuição de renda: praticamente metade da população mundial (2,8 bilhões de habitantes) sobrevive com o equivalente a menos de U$ 2,00 por dia.

Pela ótica de quem explora a mão-de-obra infantil, a justificativa dessa demanda refere-se a uma suposta destreza no aprendizado, bem como ao custo mais baixo dessa forma de trabalho. Porém, as razões dessas "contratações" são de outra natureza, pois quem contrata a mão-de-obra infantil sabe que as crianças não conhecem seus direitos, são dóceis, acatam as ordens, realizam trabalhos monótonos e tarefas repetitivas, geralmente sem queixas. Felizmente a partir dos anos 90, o trabalho infantil passa a ser combatido com veemência por diversos setores da sociedade civil. Em lugar da tolerância a esta iniquidade social, toma corpo uma série de atuações e intervenções de entidades, com o objetivo de eliminar, ou pelo menos coibir a exploração da mão-de-obra da criança e dar proteção ao trabalho do adolescente. A implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que este ano completou uma década, traz uma nova concepção de infância e adolescência, estendendo os direitos de cidadania a este segmento da população e, no capítulo 5.º, estabelecendo a proibição de qualquer trabalho a menores de 14 anos, salvo na condição de aprendiz.

Propostas, iniciativas, manifestos e até protestos de amplos segmentos sociais tornam-se cada vez mais freqüentes no combate a esta vergonhosa forma de exploração da mão-de-obra mirim. Se não surtem efeitos de imediato, chegam a minorar algumas situações e apontam uma esperança de que, um dia, o trabalho infantil será apenas e tão-somente uma página triste na história da humanidade.

No ano em que o Estatuto da Criança e do Adolescente completa 10 anos de existência, é fundamental que o "Dia da Criança", mais do que simples data para a compra de presentes, seja momento de reflexão acerca da vida e do futuro de milhões de meninos e meninas que, em vez de estarem na escola vivendo sua infância de forma digna, têm sua mão-de-obra explorada de forma vil e precoce.

Jilmar Tatto é deputado estadual pelo Partido dos Trabalhadores

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