Durante muitos anos criou-se uma oposição entre desenvolvimento e a questão
ambiental. Nesta visão equivocada e antiquada era necessário optar por um ou
outro e o extremo destas escolhas acabavam gerando nas partes também um certo
radicalismo o qual excluía a busca de um consenso. Felizmente há cada vez
mais sinais de uma nova compreensão na quais os dois aspectos podem ser
compreendidos não como opostos e nem mesmo como complementares, mas como
elementos de um projeto de convergência.
Ainda que persistam conflitos entre os dois pólos " dos quais talvez o mais
relevante seja o controle da poluição ambiental através do Protocolo de Kioto
" vai ficando mais evidente a impossibilidade de construir um desenvolvimento
real sem que ele seja sustentável, ou seja, capaz de preservar e garantir as
condições da sua sobrevivência e progresso contínuo. Da mesma forma vai
ficando mais claro que não é possível falar de preservação ambiental sem
a garantia das condições ideais de sobrevivência digna do ser humano e
somente este desenvolvimento garantirá aos cidadãos " em especial nas grandes
áreas urbanas " as condições necessárias para uma vida digna e, portanto com
qualidade de vida.
Não há problema ambiental mais grave do que as favelas e outras residências
precárias, as quais também são um dos mais graves problemas sociais. Na
medida em que a questão ambiental sai dos "guetos" de classe média e torna-se
uma discussão geral a questão habitacional torna-se um dos centros deste
debate. De um lado existe a necessidade social de garantir condições de
habitação digna a todos, de outro a necessidade de se preservar áreas como
mananciais, encostas, para não falar de outras questões também relevantes
como controle da verticalização, infra-estrutura necessária de saneamento,
transporte e equipamentos públicos.
Estas questões não estão em contradição, mas antes tendem a harmonizar-se na
medida em que existe o desejo sincero de encontrar o consenso. Um bom exemplo
de como estas questões que parecem contradizer-se se harmoniza e pode ser
encontrada na Lei específica da Guarapiranga, na qual através do debate e da
busca do consenso os deputados estaduais e o governo de São Paulo encontraram
soluções que ao mesmo tempo contribuem para a melhora das condições de vida
dos moradores da região entorno da represa, tanto quanto garante a
preservação ambiental e o abastecimento do município, bem como da qualidade
da água, questão estratégica fundamental da região metropolitana.
Dois grandes aspectos unem e quebram a aparente dualidade entre
desenvolvimento e meio ambiente, quando eles são entendidos de uma forma
integral e não superficial. A primeira é o interesse comum de todos em
preservarem a qualidade de vida e o ambiente saudável, a segunda é a existência
de adversários comuns a ambos, em particular a especulação imobiliária que
gera custos desnecessários para o desenvolvimento e empurra os cidadãos " em
especial, mas não somente os mais pobres, para áreas inadequadas tanto para
eles como para o ambiente.
A existência em muitos casos de uma "situação de fato" - tal como a ocupação
ou os loteamentos clandestinos em áreas de mananciais " não impede que mesmo
nestes casos delicados se encontre uma solução. Ninguém vai morar na encosta
do morro ou em loteamento irregular por opção. Quando o faz é por
necessidade, da mesma forma a tecnologia é grande amiga da questão social e
da ambiental, sempre surgindo novas técnicas capazes de compensar a
utilização das áreas e um dos grandes méritos da lei Específica da
Guarapiranga é incluir entre seus mecanismos esta perspectiva dinâmica de
evolução.
É sempre preciso, contudo, que exista um equilíbrio nas respostas que são
dadas a este problema. Se não houver uma consistência técnica no projeto ele
acabará por ruir e causar mais danos no futuro, da mesma forma se não houver
uma ação política de negociação, busca do consenso e convencimento da
comunidade " na qual esta veja seus interesses e necessidades atendidas "
igualmente o projeto fracassará porque faltará nele entusiasmo e a essencial
cooperação. Não é na hegemonia, mas na articulação que se encontrará a
resposta para a superação da aparente dualidade entre desenvolvimento urbano
e meio ambiente.
*Ricardo Tripoli é deputado estadual (PSDB) e líder da bancada do PSDB, foi
Secretário de Estado do Meio Ambiente e relator do projeto da Lei Específica
da Guarapiranga.