MAIS UMA VEZ, O BODE - OPINIÃO

Arnaldo Jardim*
19/12/2001 12:04

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Após os atentados terroristas nos Estados Unidos, em 11 de setembro, a sensação de que a economia mundial caminhava para uma recessão transformou-se numa quase catástrofe e todo mundo se preparou para o pior.

No Brasil, além dos problemas internos - com uma economia muito dependente do capital externo -, carregávamos o peso de uma Argentina, com sua crise interminável.

Nesse terreno fértil a especulação correu absolutamente solta e o dólar chegou à casa dos R$ 2,80, com apostas firmes de que chegaríamos com tranqüilidade aos R$ 3,00. Além disso, as taxas de juros mantiveram-se em patamares altos e a indústria e o comércio puxaram o freio, com demissões e recuos na produção.

O tempo passou, a guerra ficou circunscrita ao terreno afegão e, aos poucos, a economia mundial foi voltando à situação anterior ao dia 11 de setembro, com todos os problemas que estavam sendo detectados e em cima dos quais já se vislumbravam momentos difíceis para as economias de todos os países, em particular para os emergentes.

Bastou isso para que uma onda de otimismo invadisse o governo e muitos analistas da economia brasileira. Da angústia e depressão, passamos a um otimismo desmedido e tem-se ouvido frases do tipo "descolamos da Argentina", "superamos nossa crise de energia", "iremos crescer ainda este ano, ou na pior das hipóteses em 2002", "fomos vitoriosos na reunião da OMC em Doha", "o governo FHC volta a se fortalecer e tem grandes chances eleitorais com Roseana ou José Serra".

É a repetição da velha história do bode russo: todos reclamam da casa e aceitam a sugestão de resolver o problema colocando um bode dentro dela; a situação fica insustentável, retira-se o bode e o caos parece transformar-se em maravilha; mas, na verdade, nada mudou. A verdade é que se pintou o diabo mais feio do que ele era e agora, voltando ao ponto de partida, tudo parece mais fácil. Não é!

Esse governo que aí está tropeça feio e não enfrenta os problemas cruciais da nossa economia: os superávits da nossa balança comercial têm sido obtidos às custas da desvalorização cambial e não temos uma política voltada para a produção, seja na indústria ou na agricultura; os juros continuam estratosféricos; o nível de emprego e da atividade industrial está caindo; os indicadores sociais são ruins; a questão tributária permanece inalterada e a nossa dependência de capital externo é unanimidade entre todos os analistas.

Infelizmente, não é porque não atingimos o fundo do poço que estamos perto de sair dele. Iludir-se com tal hipótese pode ser interessante para a tentativa do governo de fazer decolar um candidato da aliança majoritária, mas é desastrosa para o futuro do país.

Quanto mais nos iludirmos, mais adiaremos o enfrentamento dos problemas e estaremos deixando o caos absoluto para o sucessor de FHC. Isso não é bom para o governo, para a oposição e para o povo brasileiro. Não somos a Argentina, não temos porque nos associarmos à sua crise - mas poderemos chegar a uma situação pior se continuarmos a fingir que tudo vai bem, obrigado.

alesp