Opinião - Mais atenção à saúde


04/05/2010 15:56

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No 1º de maio comemoramos mais um Dia do Trabalho, data de confraternização e também de reflexão sobre as condições dos trabalhadores no mundo. No Brasil, as opiniões se dividem entre posições que pregam a "flexibilização" dos direitos trabalhistas, a manutenção conforme se apresenta da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a necessidade de mudanças na legislação, incluindo a reforma sindical.

É normal que a legislação se adapte à nova realidade do mundo do trabalho, seguindo a dinâmica das transformações. Determinadas profissões e funções não existem mais e outras foram criadas.

Todas as mudanças devem ser amplamente debatidas pela sociedade, incluindo sindicatos e centrais sindicais. Porém, no acalorado do debate, é comum esquecermos aspectos importantes relacionados com a organização do trabalho e seus reflexos sobre os acidentes e doenças laborais. Assunto que diz respeito à vida e à saúde de milhões de trabalhadores.

Segundo estimativa da Organização Internacional do Trabalho (OIT), cerca de 6 mil pessoas são vítimas todos os dias de acidentes e doenças do trabalho. Isso significa que as pessoas vivem mais ameaçadas no cotidiano de suas funções profissionais do que em situações de conflitos armados.

O Brasil, infelizmente, é um dos países que apresentam maior número de acidentes e doenças laborais. Esse aspecto resulta em prejuízos sociais estimados da ordem de 4% do nosso Produto Interno Bruto (PIB).

Aspectos como longas jornadas de trabalho e ritmo frenético de produção, por exemplo, são fatores de risco para o trabalhador. Doenças como as lesões por esforços repetitivos (LER) e doenças ortomusculares relacionadas ao trabalho (Dort), que antes estavam restritas a algumas profissões, como a de bancário, hoje alcançam outros profissionais, configurando-se uma verdadeira "epidemia".

Esses fatores se estendem a diferentes situações, inclusive no trânsito das grandes metrópoles brasileiras, como São Paulo, na qual ocorrem ao menos duas mortes diárias de motoboys. Basta vê-los ziguezagueando entre os carros nas principais avenidas para evidenciar o risco que correm ao enfrentar as difíceis condições de trânsito e ao cumprir jornadas exaustivas de trabalho e prazos muito rigorosos.

Apesar das campanhas de prevenção, as doenças ocupacionais cresceram em média 134% desde abril de 2007, segundo informações do Ministério da Previdência Social (MPS). É possível que o número tenha aumentado em função do aperfeiçoamento da coleta de dados, pois a partir deste ano o Brasil adotou o Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP), mecanismo que relaciona as atividades profissionais com maior grau de incidência de enfermidades relacionadas ao trabalho.

Mas hoje é cada vez mais aceita a tese levantada por estudiosos relacionando o modo de produção do trabalho e sua evolução com as condições de saúde do trabalhador. Elas estão ligadas à perda da identidade do trabalhador, ao condicionamento para reforçar a identificação com os valores da empresa, ao estímulo ao individualismo, a contraposição e a concorrência entre os próprios funcionários.

É comum atribuir a doença ocupacional, tanto quanto o acidente de trabalho, ao desleixo do trabalhador, quando na verdade elas estão relacionadas ao modo de produção, como explicam as autoras do artigo "Subjetividade e acidente de trabalho no contexto contemporâneo", Noemi Bandeira, Wilka Conrado Antunes Dias e Maria Luiza Gava Scmidt, da Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho: "Para que se busque uma mudança efetiva nessa situação, é imprescindível que essas noções sejam abandonadas. Que a investigação dos acidentes seja feita através de um método que leve em conta todos os fatores envolvidos, principalmente a organização do trabalho".

Para as autoras, é necessário incluir o trabalhador na construção do saber, dar oportunidade para que ele se reconheça como cidadão e possa ter voz. É preciso pensar além das medidas de prevenção e segurança do trabalho, já que, normalmente, o único aspecto evidenciado é a responsabilidade e a ocorrência dos acidentes atribuídos ao trabalhador e não ao contexto que envolve a organização e às condições de trabalho.



*Davi Zaia é deputado estadual pelo PPS

alesp