Opinião - A imprensa que julga e condena


25/06/2012 09:17 | Gilmaci Santos*

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Utilizando este espaço em que nós, parlamentares, podemos expressar nossa opinião, resolvi refletir sobre a função da imprensa brasileira e o impacto de suas notícias na vida das pessoas. Cabe lembrar que minhas críticas estão embasadas em reflexões pessoais, pois deixo aos estudiosos do assunto uma análise mais aprofundada sobre o tema.

Creio que este seja um momento propício para avaliar um grupo que certas vezes coloca-se como juiz e algoz de entidades, pessoas e grupos. Nos últimos dias, a imprensa nacional fez uma cobertura exaustiva do assassinato brutal do diretor-executivo da Yoki, Marcos Kitano Matsunaga. Fundada em 1960 pelo imigrante japonês Yoshizo Kitano, a conceituada empresa seria comprada nos próximos dias pela americana General Mills, por algo em torno de R$ 2 bilhões, mas pelo excesso cometido nas coberturas da imprensa, que expuseram a vida íntima e ligaram seu nome seguidamente ao da empresa, a transação poderá não ser tão vantajosa assim. Especialistas do setor dizem que a empresa pode ter uma perda de 25%. Pergunto então: quem pagará essa conta se a Yoki tiver esse prejuízo? Todas as profissões e setores possuem seus próprios códigos de ética, por que então a imprensa não possui o seu? O que nos garante que não seremos os próximos a sofrer absurdos como este?

Isso tudo por causa de uma cobertura irresponsável que repercutiu e explodiu nas redes sociais no mesmo grau, com a reprodução de centenas de piadas de mau gosto sobre o assassinato do diretor-executivo, além de brincadeiras sobre a Yoki e seus produtos. E como no mundo empresarial é extremamente importante manter o nome de uma instituição, este talvez não seja um dos períodos mais felizes para a empresa.

Sempre ouvi falar do poder da imprensa, de suas qualidades, mas também dos malefícios que ela pode causar. Fiquei pensando no assunto nesta semana, e resolvi confabular com o leitor. A imprensa exerce uma função muito importante em nossa sociedade atual, cabe a ela ser o "grilo falante" e os olhos da sociedade. Décadas atrás, em meio à censura, os meios de comunicação eram amordaçados, mas com a mudança de contexto o jornalismo precisou tomar novos rumos.

Hoje, vemos uma febre pela nova versão e pelo "furo" acima de tudo. O problema é que, em um país de poucos leitores, nem todos conseguem ler uma notícia de maneira crítica. Nesse ponto, a notícia torna-se quase que um produto que precisa chamar a atenção para vender mais. Podemos verificar isso quando o título de uma matéria nos chama a atenção para um assunto, mas, ao lermos o texto, percebemos que a afirmação inicial não passava de uma suposição.

Sei que não é possível alcançar a objetividade total, mas é importante ter cuidado ao afirmar certas coisas. Um exemplo do mau uso da palavra foi um fato que ocorreu em março de 1994, quando vários órgãos da imprensa publicaram uma série de reportagens sobre seis pessoas que estariam envolvidas com o abuso sexual de crianças, alunas da Escola Base, em São Paulo. A divulgação do caso levou à depredação e saque da escola, os donos foram presos. No entanto, o inquérito policial foi arquivado por falta de provas. Na época, as empresas de comunicação responsáveis pelas denúncias antecipadas foram processadas, mas pergunto: as indenizações apagarão os momentos vividos por aquelas pessoas?

A Constituição Federal assegura a todos a liberdade de pensamento, mas também resguarda o direito à reputação e à honra. Geralmente, a mídia não acusa ninguém de ter cometido um crime, pois a própria lei proíbe essa atitude, mas a repercussão dada por uma suposição tem um efeito moral destrutivo e danoso ao personagem do texto. A condenação moral praticada pela imprensa, além de atingir a vítima, também convence os julgadores e a população. Nesse ponto, ela assume ao mesmo tempo a posição de julgar e condenar, fazendo com que pareça que sua função é substituir as instituições que não funcionam. A notícia, da maneira como costuma ser veiculada, quase que condena antecipadamente o suposto culpado, e caso o sujeito seja inocentado não há um esforço em dar a mesma importância ao assunto.

Não podemos deixar de lembrar que existem os bons profissionais que, mesmo com a falta de liberdade de imprensa, exercem com competência os seus trabalhos. A liberdade de imprensa é também um pressuposto do Estado Democrático de Direito, sua importância é tamanha, pois, além de trazer à tona informações desconhecidas, ela testemunha e registra fatos e momentos históricos. Mas o que se vê hoje é uma imprensa que, em geral, torna-se sensacionalista para vender mais e cai no erro de reproduzir estereótipos e julgamentos preconcebidos, levando esses profissionais ao total descrédito.

Algumas empresas de comunicação têm se preocupado unicamente em dar notícias em primeira mão que possam gerar impacto nas pessoas; esse modelo foi criado para que nós vivamos eternamente em choque, como se a única salvação fosse a libertadora verdade da imprensa.

Acordemos! Chega de recortes da realidade que em nada se parecem com a liberdade de pensamento, mas apenas aprisionam a sociedade em um tipo de pensamento preconcebido por aqueles que muitos interesses têm.



*Gilmaci Santos é deputado estadual pelo PRB e presidente estadual do partido.

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