Opinião - Um machão que ultrapassou todos os limites


11/12/2014 18:00 | Beth Sahão*

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Inicialmente relutei em escrever este artigo, temendo dar ainda mais repercussão a uma figura caricata, que sobrevive à base de polêmicas nefastas. Ocorre que, desta vez, agindo como um machão sem freios, o deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) ultrapassou todos os limites da liberdade de expressão e da autonomia parlamentar. No último dia 9/12, em pleno Congresso Nacional, sob o pretexto de rebater opiniões expressas pela deputada Maria do Rosário em um discurso proferido minutos antes ao seu, Bolsonaro passou a atacar a colega de parlamento, chegando ao cúmulo de afirmar que "só não a estupraria porque ela não merece".

A cena, uma das mais grotescas já verificadas naquela Casa de Leis nos últimos tempos, causou indignação em milhões de mulheres não só do Brasil, como também do mundo, tendo em vista que foi televisionada e reproduzida em diferentes partes do planeta.

Ora, essa frase absurda ofende não apenas a deputada a quem foi dirigida, mas agride também todas as mulheres do Brasil, na medida em que representa uma apologia escancarada ao crime do estupro.

De acordo a 7ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, somente no ano de 2012 foram registrados 50.617 estupros no Brasil, sendo que as mulheres configuram a imensa maioria dessas vítimas.

Lamentável que um representante do povo, pago com o dinheiro das cidadãs e cidadãos brasileiros, utilize os microfones do Congresso Nacional para fazer escárnio em cima de um crime que deixa cicatrizes profundas (físicas e emocionais) nas mulheres.

Mais revoltante ainda é perceber que esta não é a primeira vez que o mencionado parlamentar usa de agressividade desmedida para com as pessoas que dele discordam. Registre-se que a atitude torpe de Bolsonaro não é aceitável em hipótese alguma, independentemente de ser direcionada a mulher ou homem.

Além da já citada ofensa à deputada Maria do Rosário " situação na qual ele é reincidente, já que em 2003 já a havia agredido com termos parecidos ", consta do currículo do senhor Bolsonaro um soco desferido contra o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), em 2013, além do ataque à jornalista da Rede TV! Manuela Borges, por ele chamada de "idiota" e "analfabeta", durante uma entrevista ocorrida em abril deste ano.

Por muito tempo, as autoridades brasileiras têm sido lenientes em relação ao comportamento inadequado de Bolsonaro. Evidentemente, ele é livre para cultivar suas ideias reacionárias, ditatoriais e intolerantes " ou mesmo repeti-las a quem eventualmente tenha estômago para ouvi-las.

Isto não dá a ele o direito de se dirigir com termos tão baixos a uma representante do povo, numa agressão que atinge diretamente a subjetividade e a dignidade dela e de outras milhões de brasileiras.

Em respeito a todas as mulheres vítimas de violência " seja ela física, sexual ou psicológica ", é dever da sociedade e do povo brasileiro se posicionarem de maneira firme diante de tal fato, manifestando repúdio em relação ao fato e cobrando a devida punição para Bolsonaro.

O silêncio nesta hora significará não só omissão " e, portanto, cumplicidade com uma atitude misógina e violenta -, como também poderá acarretar sérios danos à imagem das instituições democrática. Afinal, há décadas, a sociedade civil organizada tem se mobilizado pela construção de um país com mais igualdade, tolerância e respeito. Não podemos aceitar que as autoridades permaneçam impassíveis enquanto um parlamentar (alguém que deveria zelar pelo cumprimento das leis que ajuda a aprovar) usa a tribuna da Câmara dos Deputados para fazer apologia ao estupro e ainda discriminar as mulheres que ali atuam.

O povo brasileiro não aceita mais conviver com a impunidade e aguarda uma resposta firme para os descalabros cometidos por esse senhor.

*Beth Sahão é deputada pelo Partido dos Trabalhadores.

alesp