80 Anos da revolução que mudou o Brasil


06/10/2010 20:30

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Getúlio Vargas no Rio de Janeiro<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/10-2010/REVOLUCAOde30getuliovargasNOrioEM31-10.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>  <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/10-2010/REVOLUCAOde30revistaDAsemana-08-11-30.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Coluna Prestes<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/10-2010/REVOLUCAOde30colunaprestes.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Hermes da Fonseca<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/10-2010/REVOLUCAOde30HermesdaFonsecafoto.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Washington Luis parte para o exílio<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/10-2010/REVOLUCAOde30washingtonParteParaExilio.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Dezoito do Forte<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/10-2010/REVOLUCAOde30dezoitodoforte.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Obelisco<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/10-2010/REVOLUCAOde30obelisco.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

No último domingo, 3 de outubro, mais de 100 milhões de brasileiros participaram das eleições realizadas em todo o país, mas poucos sabem que a data marcou também os 80 anos da revolução que acabou com a chamada República Velha, e levou Getúlio Vargas ao poder, mudando radicalmente a história do Brasil. A Constituição do Brasil fixou a data das eleições gerais no primeiro domingo de outubro exatamente para marcar a data em que os brasileiros conquistaram o direito ao voto livre e secreto. Desde a primeira eleição direta para a presidência da República do Brasil, em que saiu vencedor o paulista Prudente de Moraes, em 1894, dois Estados da federação, São Paulo e Minas Gerais, com raras exceções, se revezavam no poder central, criando a chamada política do "Café com leite". A indicação de Artur Bernardes, antigo presidente (cargo hoje denominado governador) de Minas Gerais, à sucessão do presidente Epitácio Pessoa, que substituiu o paulista Rodrigues Alves, falecido antes de assumir o governo, vítima de uma anemia, resultou em uma séria crise militar. A crise teve início com a publicação, pelo jornal carioca Correio da Manhã, de cartas ofensivas ao Exército e atribuídas a Bernardes, que depois descobriu-se serem falsas.

A divulgação dessas cartas fez o presidente do Clube Militar, tenente-coronel Frutuoso Mendes, convocar seus associados para uma assembleia geral, em 12 de novembro de 1921, para aprovar moção de repúdio, assinada por 322 integrantes. No dia 28 de dezembro, foi convocada nova assembleia geral, dessa vez extraordinária, do Clube Militar, que voltou à carga contra Artur Bernardes e o teor das cartas apócrifas.

Em 30 de junho de 1922, o marechal Hermes da Fonseca, ex-presidente da República, eleito para presidir o Clube Militar, enviou um telegrama ao coronel Jayme Pessoa, comandante da 6ª Região Militar, sediada em Recife, censurando a atitude das tropas do Exército contra a população, durante conflito entre as duas correntes políticas que disputavam o governo do Estado, que culminou com a intervenção federal em Pernambuco. Ao final de sua correspondência, o marechal afirmou: "Não esqueçais que as situações políticas passam e o Exército fica!"

No dia seguinte, o presidente Epitácio Pessoa determinou o fechamento do Clube Militar, através de decreto publicado no Diário Oficial da União, afirmando que "o Brasil não é uma feitoria do clube". Hermes da Fonseca, em 2 de julho, protestou contra a atitude presidencial e recebeu um aviso de repreensão por parte do governo federal, publicado no Boletim do Ministério da Guerra. Negando-se a aceitar a censura imposta, o ministro da pasta, Pandiá Calógeras, não teve dúvidas em determinar a prisão do ex-presidente da República, sob a acusação de transgressão disciplinar, por 24 horas na sede do Estado-Maior do 3º Regimento de Infantaria, sediado na praia Vermelha, bairro da Urca, Rio de Janeiro.

A punição a Hermes da Fonseca revoltou a classe militar. Alguns integrantes do Exército resolveram agir contra o governo: a Vila Militar, a Escola Militar do Realengo e o Forte de Copacabana, além de outras fortificações sediadas em Niterói, na própria capital federal e no Mato Grosso.

O comandante do Forte de Copacabana, capitão Euclides Hermes da Fonseca, filho do marechal, recebeu a solidariedade de seus comandados, no protesto contra o governo. Entre os 301 homens que serviam no forte, o tenente Antonio de Siqueira Campos, de apenas 24 anos, foi o cabeça do movimento.

O complô tomou conta de várias unidades militares, que marcaram a rebelião contra o governo federal para o início da madrugada de 5 de julho, mas, por problemas de comunicação, a rebelião acabou atrasando. O próprio governo, ciente do início da rebelião, colocou suas forças de prontidão e se preparou para reprimir a insurreição. Quando o tiro de um dos canhões do forte foi disparado, para avisar o inicio do movimento, não houve retorno dos canhões dos outros fortes, apenas um longo silêncio.

Siqueira Campos se revoltou com a covardia de seus colegas de arma. A Vila e a Escola Militar, que deveriam aderir ao movimento, foram logo sufocadas por tropas leais ao governo. O capitão Euclides, pelo telefone, foi chamado pelo ministro da Guerra ao Palácio do Catete, sede do governo brasileiro, para conferenciar. Antes de sair, ele chamou a tropa e informou que quem quisesse deixar o forte poderia fazê-lo. Nada menos que 272 homens assim o fizeram, permanecendo apenas 29.

Ao chegar ao Palácio do Catete, o capitão Hermes da Fonseca foi vítima de uma armadilha, sendo surpreendido com sua prisão. O governo não tinha pensado em negociar, e, apesar de detido, Hermes da Fonseca foi autorizado a se comunicar com Siqueira Campos, no forte, e lhe relatou o ocorrido. Siqueira resolveu não permanecer no forte, alvo de pesada artilharia, por terra, mar e ar. Às 10h, a cidade foi sacudida por três tiros fortes de canhão, que atingiram o Quartel General, no centro da cidade, e propriedades civis, o que resultou em destruição, feridos e mortos.

A cidade, assustada, fechou as portas do comércio. Muita gente fugiu do centro e, por volta do meio dia, o governo determinou o encerramento do expediente das repartições públicas, por questão de segurança.

Siqueira mandou arriar a grande bandeira do Brasil, que tremulava no mastro do forte, e ordenou que fosse trazida à sua presença e recortada em 29 pedaços, sendo entregue para cada um dos presentes e guardado o pedaço do capitão Hermes. Ficou resolvido que a unidade poderia seguir, a pé, pela Avenida Atlântica, à margem da praia de Copacabana, em direção à cidade. No caminho, um único civil, Newton Prado, aderiu à caminhada e recebeu o pedaço da bandeira que seria entregue ao capitão Hermes da Fonseca.

As tropas ficaram aguardando de tocaia os rebeldes na Praça Serzedelo Correa, nas ruas Barroso (hoje Siqueira Campos), Hilário de Gouveia e 9 de Fevereiro (hoje Paula Freitas), todas esquinas da Atlântica, a 1,5 quilômetro do forte. O governo federal usou toda a força disponível e violenta repressão se fez sentir, com desproporcionalidade gritante. Para cada um dos revoltosos havia nada menos que 142 soldados legalistas fortemente armados. Após intensa fuzilaria, os que não morreram vítimas de balas, foram mortos por baioneta, nas areias da praia.

Essa ação entrou para a história do Brasil com a denominação "18 do Forte", apesar de o número verdadeiro ter sido somente doze. Entre os poucos sobreviventes desse heróico movimento, estavam os tenentes Siqueira Campos e Eduardo Gomes. Essa epopeia seria uma das determinantes da Revolução de 1930, com a adesão de jovens oficiais do Exército.

O presidente Artur Bernardes assumiu o governo, em 15 de novembro de 1922. Em seus quatro anos de atribulado mandato, governou com mãos de ferro, com permanente estado de sítio em todo o Brasil, prendendo e desterrando para os confins do país seus opositores, censurando e fechando jornais. Nesse conturbado período, haveria uma guerra civil no Rio Grande do Sul, em 1923, e uma revolução em São Paulo, em 1924, quando a capital paulista foi tomada por revolucionários comandados pelo general Isidoro Dias Lopes. Após a fuga em direção ao interior do país, os integrantes formaram a chamada Coluna Miguel Costa-Luis Carlos Prestes, que percorreu praticamente a pé 36 mil quilômetros, através de 12 Estados brasileiros, sob perseguição implacável das tropas do governo. Em fevereiro de 1927, cansados e famintos, cruzaram o pantanal matogrossense, com muitos doentes e feridos, para pedir asilo político à Bolívia, sem terem sido derrotados pelas tropas governistas.

Para a sucessão presidencial, o acordo firmado entre mineiros e paulistas indicou o senador por São Paulo, Washington Luis Pereira de Sousa, "paulista de Macaé" - referência à cidade fluminense onde nasceu o senador que construiu sua vida política em São Paulo. Washington Luis foi vereador e prefeito em Batatais, deputado estadual, prefeito da capital paulista, secretário da Justiça e Segurança Pública do Estado, presidente do Estado de São Paulo, senador estadual e senador federal. Sem competidor, ele foi eleito, em março de 1926, e assumiu em novembro do mesmo ano. Um dos primeiros atos como presidente da República foi revogar o estado de sítio, porém sem a preocupação e, muito menos, a inteligência de enviar ao Congresso Nacional, durante todo o seu governo de quatro anos, uma mensagem de anistia para pacificar a nação. Esse foi seu grande erro.

O presidente Washington Luis foi uma esfinge que ninguém conseguiu decifrar. Os políticos tentavam, em vão, saber sua opinião sobre a sucessão presidencial, mas ele afirmava que o assunto seria discutido oportunamente, em setembro de 1929. Depreendia-se que o sucessor seria o presidente de Minas Gerais - os estados federados tinham presidentes, não governadores -, Antonio Carlos Ribeiro de Andrada, que apostava todas as fichas em sua indicação. O Rio Grande do Sul era governado pelo ex-ministro da Fazenda de Washington Luis, Getúlio Dornelles Vargas, que havia assumido o governo, em janeiro de 1928, e acompanhava também o jogo de xadrez que se tornara a escolha do nome às eleições de 1ª de março de 1930.

Ainda em março de 1928, os deputados federais gaúchos Assis Brasil e Batista Luzardo confiaram a Paulo Nogueira Filho, integrante do Partido Democrático de São Paulo, a incumbência de organizar a chamada "revolução democrática" em solo paulista, após entendimentos com o coronel Miguel Costa, que se encontrava exilado em Los Libres, na Argentina.

Apesar de todas as escaramuças e tentativas de guardar segredo, a informação vazou e acabou quebrando o acordo tácito de revezamento entre São Paulo e Minas Gerais. Washington Luis decidiu unilateralmente indicar o presidente de São Paulo, Júlio Prestes, para sua sucessão. No mês de dezembro, o advogado João Daudt de Oliveira, após conversa com Afrânio de Melo Franco, foi a Porto Alegre transmitir a Getúlio Vargas a decisão de Minas Gerais em vetar o nome de Júlio Prestes à sucessão presidencial.

Em 5 de janeiro de 1929, Washington Luis escreveu uma carta a Getulio Vargas, referindo-se à noticia, segundo ele, infundada, de uma conferência sobre a sucessão presidencial. Doze dias depois, Getúlio respondeu ao presidente.

A sucessão era um assunto proibido, no início de 1929, mas o então secretário do Interior e Justiça do governo do Rio Grande do Sul, Oswaldo Aranha, em correspondência a Getúlio, escreveu: "Chegou a nossa vez..."

Vargas e seus correligionários ainda acreditavam que fosse possível um acordo com o presidente da República sobre a sucessão. O líder da bancada gaúcha na Câmara Federal, deputado João Neves da Fontoura, em 6 de maio, escreveu a Getúlio Vargas, sugerindo que caso o cargo de presidente não fosse para o Rio Grande do Sul - inclusive era lembrado o nome do líder rio-grandense Borges de Madeiros - que fosse pleiteada a vice-presidência para o próprio Getúlio.

Os mineiros, para forçar a situação, resolveram lançar, em junho, o nome de Antonio Carlos Ribeiro de Andrada ao cargo de presidente da República. Realizaram para o ex-presidente de Minas Gerais um banquete em Juiz de Fora. Depois, em Belo Horizonte, foi organizada um grande passeata com 1.200 representantes de 215 municípios. Dias depois, em 12 de junho, o parlamentar Feliciano Sodré, na tribuna do Senado Federal, pronunciou-se em favor de uma chapa com Antonio Carlos e Getúlio Vargas. No dia seguinte, na Câmara dos Deputados, teve início o debate sobre a sucessão presidencial. Ao verificar que seu nome seria mesmo preterido por Washington Luis, Antonio Carlos resolveu apoiar o nome de Vargas, que a princípio não concordou com a iniciativa.

Neves da Fontoura reuniu-se, no Hotel Glória, no Rio de Janeiro, no dia 15 de julho, com a bancada do Rio Grande do Sul, para anunciar o lançamento da candidatura de Vargas. Getúlio Vargas também havia escrito uma carta ao chefe da nação, informando sua pretensão em se candidatar. A reação do presidente foi de profunda irritação, e, apesar de a correspondência ser reservada, Washington Luis a divulgaria com o intuito de comprometer o presidente gaúcho. Em sua resposta, afirmou que iria fazer uma consulta aos outros presidentes, mas, na verdade, encaminhou sua imposição da candidatura de Júlio Prestes. Dos 17 presidentes estaduais consultados, somente João Pessoa, da Paraíba, não endossou o nome do governador paulista.

João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, sobrinho do Epitácio Pessoa, presidente da República no período 1919-1922, ao ser indagado sobre o apoio ao candidato oficial, teria respondido com uma palavra: Nego! Essa palavra hoje faz parte da bandeira da Paraíba. João Pessoa seria indicado vice-presidente da chapa da Aliança Liberal, de Getúlio Vargas.

Com seu nome preterido pelo governo federal, colocando um ponto final em sua grande ambição política, Antonio Carlos deu o troco. Em uma audiência, no Palácio do Catete, Afrânio de Melo Franco entregou ao presidente da República uma carta de Antonio Carlos, na qual tomava a iniciativa de indicar o nome do presidente do Rio Grande do Sul à sucessão. O confronto estava literalmente armado.

Na edição desta quinta-feira, 7/10, o Diário do Poder Legislativo publica novo texto sobre a Revolução de 30, dando continuidade às informações contidas no artigo desta quarta-feira, 6/10.



*Antônio Sérgio Ribeiro é advogado, pesquisador e diretor do Departamento de Documentação e Informação da Assembleia.

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