Discussão sobre Progressão Continuada reúne 500 pessoas


02/05/2002 16:17

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Apreensão de pais e professores com o aprendizado nas escolas fez faltar espaço no auditório para tantos interessados

DA ASSESSORIA

Motivada pelo Projeto de Lei 428/2001, de autoria do deputado estadual e líder do PT, Carlinhos Almeida, a audiência pública da Comissão de Educação da Assembléia Legislativa, realizada em São José dos Campos dia 25/4, reuniu cerca de 500 participantes. De acordo com Almeida, para a maioria deles, "a progressão continuada virou aprovação automática".

Entre pais, alunos, professores e até supervisores e diretores de escola presentes, parecia unânime a crítica à maneira como foi implantado o fim da repetência nas escolas estaduais. "Faltou diálogo para as escolas se prepararem para a nova realidade e as condições básicas não foram adaptadas, ainda existindo salas de aula com mais de 50 alunos, por exemplo", acusa o deputado petista. "Não é de se estranhar que hoje alunos cheguem quase ao final do ensino fundamental sem ao menos serem alfabetizados".

O projeto de Carlinhos Almeida propõe a suspensão e revisão do mecanismo da progressão continuada. Se o projeto for aprovado, será criada uma comissão de especialistas da USP, Unesp e Unicamp, além de representantes da Secretaria Estadual da Educação e das entidades representativas dos profissionais da área, como Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), Centro do Professorado Paulista (CPP), Sindicato dos Servidores da Educação (Afuse), União de Diretores do Magistério Oficial do Estado de São Paulo (UDEMO) e Sindicato de Supervisores do Magistério no Estado de São Paulo (Apase), para avaliar as causas dos problemas e, no prazo de um ano, propor novas bases para o funcionamento do sistema de avaliação. Segundo Carlinhos, a idéia do projeto nasceu depois que ele recebeu inúmeras reclamações de pais e professores e tomou conhecimento da pesquisa realizada pela APEOESP que demonstrava índices de mais de 90% de rejeição ao novo sistema.

Para a deputada Maria Lúcia Prandi, presidente da Comissão de Educação da Assembléia Legislativa, o projeto de lei do deputado Carlinhos tornou-se um instrumento que permitiu fazer a discussão da Progressão Continuada. "Mas desejamos que, para além da discussão, o projeto se transforme numa realidade, em que todos os educadores sejam ouvidos para construir uma política de avaliação capaz de garantir o direito ao conhecimento", declarou a deputada durante a audiência. Outro membro da Comissão de Educação presente, deputado Salvador Khuriyeh (PSB), avalia que o projeto tem o mérito de forçar o governo a aceitar da parte da sociedade uma discussão que deveria ter sido promovida pelo próprio Executivo antes de implantar a progressão continuada.

A presidente da Apeoesp, Maria Isabel Noronha, declarou na audiência o total apoio da entidade à aprovação do PL 428/2001, que considerou ousado por qualificar o debate em torno da avaliação. "O que está aí não é nem nunca foi progressão continuada, dada a falta de condições estruturais da escola pública. É aprovação automática e sua conseqüência é uma exclusão postergada, pois tira do educando o direito de acesso ao conhecimento acumulado pela sociedade".

Também presente à audiência, a deputada federal Ângela Guadagnin (PT/SP) lembrou as conseqüências da política de educação do governo estadual sobre a violência na escola, "que nunca teve índices tão altos como hoje", ressaltou.

A audiência ainda contou com a participação das secretárias de educação das cidades de Jacareí e Caçapava e representantes da Secretaria de Educação de São José dos Campos, da Udemo, da Apase e dos vereadores de São José dos Campos Giba Ribeiro (PT), Izélia (PT) e Amélia Naomi (PT) e da vereadora Dina (PT), da cidade de Cunha. Ao todo, 421 pessoas assinaram a lista de presença.

Aula sobre educação

A estrela da audiência foi a educadora e presidente da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, deputada federal Ester Grossi (PT/RS). Quando foi secretária de Educação de Porto Alegre, inaugurou a utilização do método construtivista em redes públicas de ensino. A explanação da deputada fez a audiência ir muito além da discussão de uma política pública, transformando parte do evento numa aula teórica sobre educação.

Apesar de ver com pessimismo o quadro educacional da atualidade, Ester Grossi considera este período histórico muito empolgante para os educadores pelas novas descobertas e técnicas educacionais. "Descobriu-se que todos podem aprender", destaca. "Ao nos tornarmos humanos, não somos mais seres de natureza, mas sim seres de cultura. Isso significa que nós não nos desenvolvemos, nós aprendemos. Nós podemos aprender qualquer coisa, em qualquer idade, desde que sejamos adequadamente provocados", ensina a palestrante, citando grandes teóricos da educação.

"Até hoje se imaginou que os alunos amadureciam e se desenvolviam através de uma evolução natural, recomendando- se até que (nós professores) tivéssemos paciência e, mais do que isso, que não atrapalhássemos esse desenvolvimento. Mas, a verdade é que se não interferirmos, o processo de aprendizagem não acontece. Essa é a grande conclusão da ciência da educação na atualidade: a inteligência não é um dom, é o resultado de um processo".

O deputado Carlinhos Almeida valorizou muito a abordagem teórica da educadora. "Como ela mesma alertou, quando não se busca o estudo profundo do caso, a tendência é fazer análises superficiais e acabar por propor outras ''fórmulas mágicas'' para tratar do problema central, que é o da aprendizagem". Carlinhos diz que, por isso mesmo, propõe no Projeto de Lei 428/2001 a composição de um grupo de trabalho de alto nível, contando tanto com especialistas teóricos como práticos do dia-a-dia do processo educativo. "Não sou um especialista e não ousaria dizer no projeto qual caminho é o certo ou o errado. Apenas sei que como está não pode ficar".

Definições da audiência

Ao final da audiência, a plenária aprovou por consenso algumas decisões: declarar rejeição à forma autoritária como foi implantada a Progressão Continuada na Rede Estadual de Ensino; declarar o consenso entre os presentes de que existem graves problemas na rede no que tange à aplicação da progressão continuada e do ciclos, e que há necessidade de revisão; reivindicar que a revisão seja feita em caráter de urgência e de forma democrática, com a participação de todos os setores envolvidos, inclusive pais e alunos; defender a aprovação do Projeto de Lei 428/2001 e/ou a abertura imediata de negociação com garantia de efetivar a revisão no moldes já expostos acima; que seja aberta uma discussão ampla e democrática para a construção do Plano Estadual de Educação, com a participação de toda a sociedade, que deverá funcionar como um "plano diretor" para o setor, com o objetivo de estabelecer diretrizes estáveis, ou seja, que não sejam totalmente modificadas a cada nova linha de conduta do governo ou a cada mudança de governante.

Carlinhos diz pretender continuar a promover debates sobre este tema. Ele tem visitado escolas e dado palestras em diversas cidades. "Queremos que sociedade se posicione para que a Assembléia aprove o Projeto de Lei 428 ainda este ano, de modo a promovermos a revisão necessária durante o ano de 2003".

alesp