Audiência pública discute desligamento de professores experientes e obrigação do uso de aplicativos

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29/02/2024 16:37 | Atividade parlamentar | Da assessoria do deputado Carlos Giannazi

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Audiência Pública Fora Feder<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-02-2024/fg319760.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Carlos Giannazi (PSOL), em conjunto com a Frente Paulista em Defesa do serviço Público, realizou na Alesp, em 28/2, a audiência pública Fora Feder! O encontro enumerou uma série de desacertos do secretário da Educação que, segundo os participantes, revelam sua verdadeira intenção de desmantelar a estrutura da secretaria de forma a assegurar e legitimar o uso de equipamentos e serviços eletrônicos, em grande parte vendidos ao Estado pela empresa da qual é sócio, a Multilaser (atual Multi).

"O governo despreza a experiência da rede paulista, porque, em vez de buscar a estabilidade de seus profissionais, realizando grandes concursos públicos, aposta na precarização dos vínculos dos professores, diretores de escola, supervisores... E isso acontece para garantir, com base em insegurança e medo, o uso alienado das plataformas eletrônicas de ensino e controle", afirmou Rosaura Almeida, presidente do Sindicato dos Supervisores de Ensino (Apase).

Para comprovar o que disse, Rosaura citou os critérios para avaliação dos professores, que se baseiam no quanto seus alunos estão acessando a plataforma Tarefa de Casa, um software milionário comprado sem licitação. "Não é levado em conta se os estudantes estão tendo aula com professores habilitados, se há profissionais os acompanhando nos intervalos e nas trocas de aulas, se os diretores são efetivos, de forma que possam realizar seu trabalho com liberdade, assim como os supervisores que acompanham as escolas." Por tudo isso, a supervisora de ensino considerou que a audiência pública era ao mesmo tempo um instrumento de denúncia e de união na luta dos profissionais da educação, dos parlamentares, dos estudantes e dos defensores dos serviços públicos e da população em geral.

R$ 9 bilhões a menos

Tanto Valentina Andrade, da União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo, (Umes) quanto Alberto de Souza, do Sindicato dos Trabalhadores da Unesp (Sintunesp) e do Fórum das Seis, repudiaram a intenção do governador Tarcísio de Freitas de cortar R$ 9 bilhões da educação, o que se tornará possível caso a Assembleia aprove a emenda à Constituição do Estado (PEC 9/2023) que reduz o gasto obrigatório na área de 30% da receita para apenas 25%, o mínimo estipulado pela Constituição Federal. "Se o Estado precisa de mais dinheiro para a saúde, por que não revê as isenções de dezenas de bilhões concedidas a setores econômicos que não se revertem em benefícios para a população?", questionou o sindicalista.

O presidente do Sindicato dos Especialistas de Educação (Udemo), Chico Poli, ressaltou que o próprio secretário Feder defende a redução da dotação orçamentária para a sua pasta, o que é um acinte tendo-se em vista o péssimo estado de conservação da rede e os salários pagos abaixo do piso nacional. "Sobrando dinheiro para comprar mais plataformas e aplicativos dele próprio e de seus amigos é o que lhe basta", resumiu, salientando ainda que esse enfoque nos meios eletrônicos acontece em um momento em que todos os países mais avançados em educação pública estão abandonando a ideia, como Suécia, Japão, Finlândia e até o estado da Califórnia, nos Estados Unidos. "O secretário tem de justificar o contrato de R$ 200 milhões que ele próprio fez com o Estado para aquisição desse material, sem licitação", pontuou.

Chico Poli relatou que, após a pior atribuição de aulas da história, que deixou muitas escolas sem professores e muitos professores sem escolas, agora está sendo exigido que o vice-diretor e todos os especialistas assumam salas de aulas para suprir a falta de professores. "É uma gambiarra pedagógica", denunciou.

Vigiar e punir

O grande número de diretores designados também foi criticado pelo presidente da Udemo, que vê a medida como uma estratégia para esvaziar a autonomia da função. Como os diretores designados podem ser desligados do cargo com a mesma facilidade com que foram nomeados, eles estão sob um vínculo de subordinação infinitamente maior, o que é tudo o que o secretário quer. Assim, esses diretores são forçados a praticar até mesmo atos ilegais, como obrigar seus subordinados a instalarem aplicativos de controle em seus celulares particulares.

José Jorge Maggio, do Fórum Regional de Educação do ABCDMRR, relatou que essa administração está atribuindo professores para que exerçam até mesmo os cargos de dirigentes e supervisores, isso sem que tenham antes exercido a função de diretores de escola. "Como uma pessoa que não tem essa expertise, essa experiência, vai avaliar outra?", indagou. Para Maggio, uma das principais bandeiras da categoria tem de ser a liberdade de aprender e ensinar, como é preconizada no artigo 206, inciso II, da Constituição Federal. "Não à digitalização. Queremos respeito aos direitos, garantia de emprego e valorização de todos os profissionais da educação com o pagamento do piso salarial de forma integral aos ativos e aposentados."

Alta rotatividade

A substituição de professores experientes por novatos é outro artifício para tornar os docentes submissos. A mudança de critérios na atribuição de aulas reduziu muito o peso do tempo de magistério, ficando o principal critério de classificação o tamanho da jornada pretendida pelo professor. A escolha desse critério pelo secretário Feder é fácil de entender: um trabalhador que dependa 100% de um único empregador estará mais sujeito a seus mandos e desmandos. Melhor ainda se for um iniciante na rede, que nunca viu a dinâmica das escolas funcionar de outra maneira.

Um dos profissionais descartados por esse mecanismo foi a professora Sandra, do município de Matão. Com 30 anos de magistério, ela e várias de suas colegas foram posicionadas no final de uma lista, com mais de mil nomes vinculados à Diretoria de Ensino de Araraquara. O crime dessas professoras foi o de possuir diploma de pós-graduação lato sensu em áreas como educação especial e inclusiva, psicopedagogia e neuropsicopedagogia. "Nós estamos sendo tratadas como se estivéssemos agindo de má-fé. Chegaram a dizer que poderíamos ser obrigadas a devolver os pagamentos de anos anteriores", disse, indignada.

O diretor da Apeoesp, Aldo dos Santos, afirmou que a entidade já deliberou pelo Fora Feder em seu 27º Congresso. "Não adianta quem quer que seja ficar passando pano para o secretário, que é persona non grata na educação pública do Estado de São Paulo." Ele criticou também a retirada na prática das disciplinas de filosofia, sociologia, artes e outras da área de humanas do currículo estadual. "O governo estadual não quer seres pensantes, quer pessoas que possam ser manipuladas por suas ferramentas eletrônicas", disse, prevendo um futuro de desemprego em massa no magistério, quando os aplicativos serão a única educação ofertada às famílias de baixa renda.

Participaram da audiência pública os professores Maria Bernadete Ramos, representando a Associação dos Professores Aposentados (Apampesp), Guilherme Nascimento, Edson Gabriel Garcia, Jussier Rosendo (demitido da rede em 2017 por perseguição política) e Volmer Pianca, a deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL-SP) e o vereador da capital Celso Giannazi (PSOL), que criticou o acordo feito entre o governador e o prefeito Ricardo Nunes para a municipalização de 50 escolas (25 neste ano e 25 em 2025), mesmo sem que haja previsão legal para tanto. "Essas escolas estão totalmente sucateadas e o município não tem previsão orçamentária para fazer as reformas necessárias", explicou.

alesp