UFSCar concede título de Doutora Honoris Causa a deputada em reconhecimento à sua trajetória

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10/12/2025 17:03 | Atividade Parlamentar | Da assessoria da deputada Leci Brandão - Fotos: Liz Souza e Malu Barbosa

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Dep. Leci Brandão - Foto:  Liz Souza <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-12-2025/fg358367.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Cerimônia ocorreu em 8/12 - Foto: Malu Barbosa<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-12-2025/fg358368.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Deputada e sambista é homenageada por sua relevante atuação antirracista

A Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) concedeu, na noite de segunda-feira (8), o título de Doutora Honoris Causa à cantora, compositora e deputada estadual Leci Brandão, em uma cerimônia marcada por forte emoção, reconhecimento histórico e celebração da intelectualidade negra no Brasil. O auditório ficou lotado para acompanhar um momento visto por muitos como simbólico e necessário, especialmente no contexto das lutas por igualdade racial no país.

A indicação do título partiu do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da UFSCar e de um coletivo de docentes das áreas de Ciências Sociais, Letras, Educação e Artes e Comunicação da Universidade. O grupo composto por Robson Pereira da Silva, Gleidylucy Oliveira da Silva, Renilson Rosa Ribeiro e Adelcio Camilo Machado, contou ainda com o apoio das pesquisadoras Ana Flávia Magalhães Pinto e Thaís Leão Vieira, da UnB e da UFMT. A proposta reconhece a atuação singular da artista na difusão da cultura negra, na resistência antirracista e na formação política e educativa do país.

Durante a cerimônia, professoras e professores destacaram que as canções e ações políticas de Leci funcionam como verdadeiros registros históricos. Afirmaram que sua obra, ao denunciar injustiças e afirmar identidades, se conecta diretamente com debates sobre raça, gênero, religiosidade afro-brasileira e memória, tornando sua contribuição incontornável para a sociedade brasileira. Também foi ressaltado que o samba, no trabalho da artista, se transforma em ferramenta pedagógica e espaço de preservação cultural onde muitas vezes o Estado falhou.

O primeiro a se pronunciar durante a solenidade foi o professor Robson Pereira da Silva, que apresentou uma reflexão construída a partir de matrizes do pensamento negro, das tradições afro-brasileiras e do impacto cultural e político da homenageada. Em sua fala, ressaltou que a compreensão de Leci de que "é coisa de Orixá" sintetiza a energia que a move e a conexão espiritual que orienta sua caminhada, afirmando sua condição de "Ialodê". Para ele, "A frase ?é coisa de Orixá? [?] constitui um eixo central para uma artista que tão bem pensou uma obra carregada de axé como fonte política". Robson relacionou ainda a força da obra de Leci às grandes referências do feminismo negro, dizendo que "Suas canções são teses defendidas contra a injustiça social, o racismo, o machismo e a precarização da vida. A voz, a letra, o corpo da nossa agora doutora Leci Brandão trazem para dentro da academia a complexidade do pensamento e da vida cultural negra".

Na sequência, André Pereira da Silva, Secretário-Geral de Ações Afirmativas da Universidade, contextualizou a homenagem dentro das transformações provocadas pelas políticas de inclusão no ensino superior. Ele lembrou que a presença de estudantes negros na UFSCar aumentou expressivamente nos últimos anos e afirmou: "Antes das ações afirmativas, a UFSCar tinha 14% de estudantes negros; hoje temos mais de 32%. Essa

homenagem não é apenas um reconhecimento acadêmico; é um ato de justiça [?] a trajetória de vida e a obra de Leci Brandão são um farol". Para ele, a deputada é uma figura "disruptiva", cuja história comprova que a produção intelectual negra é fundamental dentro e fora da universidade. Concluiu reforçando: "Você já faz parte da revolução que um dia acontecerá. Mulher negra, criada no samba, cantora, compositora, atriz, parlamentar: uma intelectual brasileira".

A diretora do Centro de Educação e Ciências Humanas, professora Ana Cristina Juvenal da Cruz, iniciou seu discurso recuperando palavras da própria artista: "É uma grande farsa dizer que somos apenas o país da festa [?] Cabe a nós participar trabalhando, exigindo e transformando". Ela destacou a importância do samba ? uma criação negra ? como ferramenta de educação e memória, enfatizando que esse gênero sempre registrou histórias que foram negadas nos currículos oficiais. "O samba sempre ensinou sobre nós, quando nossas histórias não estavam nos livros. Por sua vida e legado, encontramos uma obra intelectual que retrata e interpreta o Brasil". A diretora também recordou que o campus da UFSCar foi construído sobre terras onde viveram pessoas negras escravizadas, conectando passado e presente por meio da contribuição de Leci.

A ativista e médica Jurema Werneck, madrinha da cerimônia, reforçou o simbolismo afetivo e político da conquista. Contou que, em seu lar, Leci sempre foi tratada como alguém que abriu caminhos: "Na minha casa, Leci sempre foi chamada de doutora. Você sempre abriu caminhos, como Ogum, que inventa ferramentas e segue em frente". Ao relacioná-la ao Orixá Ogum, Jurema destacou a força, determinação e capacidade de criar novas possibilidades, traços que, segundo ela, definem a trajetória de mais de cinco décadas da sambista.

Ao receber oficialmente o diploma, Leci Brandão cantou, agradeceu e dirigiu palavras marcadas por emoção e consciência histórica. Recordou sua origem e disse: "Nasci em Madureira [?] jamais poderia imaginar que um dia teria a oportunidade de receber um reconhecimento como este". Reafirmou que, para uma mulher negra, "desistir nunca foi opção", lembrando que sua voz política sempre se construiu por meio da música, falando sobre desigualdades, periferias e luta. Fez agradecimentos ao Neab e a intelectuais negros que a inspiraram e dedicou a honraria à resistência de tantas mulheres negras que, mesmo silenciadas, mantiveram viva a criação e a esperança: "Este título é de todas as mulheres negras que ousaram criar, sonhar e sobreviver mesmo quando tudo lhes foi negado". Também criticou o racismo estrutural e reafirmou seu compromisso com a equidade, para que todos possam ser "plenos de possibilidades e oportunidades para além da condição de raça, de gênero e de orientação sexual".

Leci também fez questão de destacar que sua formação vem das ruas, da música e do samba. Relembrou ensinamentos de pensadoras negras e reforçou que sua atuação artística e política é parte de uma longa linhagem de mulheres que lutaram para que as novas gerações pudessem sonhar. Para ela, a outorga do título representa a vitória coletiva de um povo que transformou a dor em criação e resistência.

A noite terminou em clima de celebração, com apresentações culturais e manifestações de carinho. Para muitos que acompanharam a cerimônia, o evento não homenageou apenas a artista, mas reafirmou a importância de enxergar a cultura popular, o samba e as

experiências da população negra como fontes legítimas de conhecimento e de transformação social.

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