A dificuldade de a vítima reconhecer o trabalho escravo deu a tônica de audiência pública presidida pela deputada estadual Beth Sahão (PT) nesta quinta-feira (13), na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Palestrantes como o juiz trabalhista, Fábio Augusto Branda e a procuradora do Ministério Público do Trabalho, Alline Oishi, recorreram a casos concretos, de trabalhadores resgatados em São Paulo, para demonstrar como as situações de escravidão moderna costumam ser camufladas, especialmente em serviços domésticos e na indústria têxtil. Branda recordou que empregadores condenados por trabalho escravo costumam usar táticas como o pertencimento familiar ("você faz parte da família") e dívidas de gratidão descontadas dos salários dos trabalhadores. Já Oishi acrescentou a existência de falsos paradigmas que restringem a escravidão contemporânea ao meio rural e a exploradores endinheirados. "Existe no meio urbano e no trabalho doméstico pobres que exploram mais pobres sob o manto do afeto". A procuradora também citou a "cegueira deliberada" de empresas têxteis que se recusam a realizar o controle da cadeia produtiva. Beth Sahão informou que vai solicitar o cumprimento da Lei 14.946/2013. A norma paulista estabelece a cassação da eficácia da inscrição no cadastro de contribuintes do ICMS de estabelecimentos punidos por condutas que configurem condição análoga à escravidão. "A aplicabilidade disso é zero. Precisamos fazer com que as leis sejam cumpridas. São Paulo é o segundo maior estado em número de pessoas que foram denunciadas por trabalho análogo ao escravo. Então, é preciso que as medidas sejam rápidas e urgentes". Representantes de instituições federais, como a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego e o Incra, alertaram para o aumento de casos no Estado. Somente em 2022, 146 pessoas (72 delas estrangeiras) foram resgatadas em São Paulo trabalhando em condições análogas à escravidão. O coordenador estadual do Combate ao Trabalho Escravo da Superintendência, Paulo Warlet, ressaltou a importância de políticas eficazes no pós-resgate, apesar de ter reconhecido que "não tem cura, nada que o Estado possa fazer vai devolver a dignidade [a essas pessoas]". Docentes e estudantes universitários, sindicalistas e membros do Movimento Sem Terra (MST) também participaram da audiência na Alesp.